ARTIGO ORIGINAL

 

Comparação Dosimétrica entre Técnicas de Planejamento de Radioterapia para Câncer de Mama Esquerda

Dosimetry Comparison of Radiotherapy Planning Techniques for Left Breast Cancer

Comparación Dosimétrica entre Técnicas de Planificación de Radioterapia para el Cáncer de Mama Izquierdo

 

 

doi: https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2023v69n3.4020

 

Tatiane Mayla Domingos Prandi¹; Herofen Zaias²; Charlene da Silva³; Juliana dos Santos Müller4; Larissa Palhano da Silva Blasius5; Patrícia Fernanda Dorow6

 

1CORB Radioterapia. Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC). Florianópolis (SC), Brasil. E-mail: tatimayla@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0009-0003-5161-1370

2CORB Radioterapia. Itajaí (SC), Brasil. E-mail: herofenz@yahoo.com.br. Orcid iD: https://orcid.org/0009-0008-8136-0214

3-6IFSC. Florianópolis (SC), Brasil. E-mails: charlene.silva@ifsc.edu.br; juliana.muller@ifsc.edu.br; larissa.psb01@aluno.ifsc.edu.br; patriciad@ifsc.edu.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-0761-4358; Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-8593-304X; Orcid iD: https://orcid.org/0009-0009-0441-8109; Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-9036-8356

 

Endereço para correspondência: Tatiane Mayla Domingos Prandi. Rua Cesário Chaves, 222, aptos. 1202-3 – Fazenda. Itajaí (SC), Brasil. CEP 88302-350. E-mail: tatimayla@gmail.com

 

 

RESUMO

Introdução: A radioterapia é utilizada no tratamento do câncer de mama. No planejamento radioterápico, há formas de desenvolver o plano de tratamento, como a radioterapia 3D conformacional (3D-CRT), a radioterapia de intensidade modulada (IMRT) e a arcoterapia volumétrica modulada (VMAT). Objetivo: Comparar as doses nos órgãos de risco e no volume-alvo de tratamento com as diferentes técnicas de planejamento: 3D-CRT, IMRT, VMAT e VMAT modificada para o tratamento do câncer de mama em um phantom antropomórfico. Método: O plano de tratamento foi realizado no sistema Eclipse™ v.15.6 da Varian a partir de imagens de tomografia computadorizada adquiridas de phantom. A dose de prescrição estabelecida foi de 45 Gy em 25 frações de 1,8 Gy/dia. Resultados: Sobre a cobertura do volume do alvo planejado (PTV), as técnicas 3D-CRT (FILTRO e field-in-field – FIF) demonstram cobertura inferior comparada aos planos de IMRT e VMAT. Já o plano 3D-CRT-FIF apresenta maior homogeneidade comparado ao 3D-CRT-FILTRO. Para o pulmão contralateral, os planos de 3D-CRT (FIF, FILTRO) obtiveram restrições melhores em relação aos demais planos. Sobre a exposição cardíaca, os planos 3D-CRT (FIF, FILTRO) apresentaram maiores benefícios do que as técnicas IMRT, VMAT e VMAT modificada. Conclusão: As técnicas convencionais 3D-CRT (FIF, FILTRO) apresentaram menores doses nos órgãos de risco. Contudo, as técnicas IMRT e VMAT obtiveram melhor homogeneidade e conformidade da dose distribuída no PTV ao comparar as técnicas convencionais.

Palavras-chave: radioterapia conformacional; radioterapia de intensidade modulada; neoplasias da mama; doses de radiação.

 

 

ABSTRACT

Introduction: Radiotherapy is utilized to treat breast cancer. For radiotherapy planning, there are several ways to develop the treatment plan, such as 3D conformal radiotherapy (3D-CRT), intensity modulated radiotherapy (IMRT) and volumetric modulated arc therapy (VMAT). Objective: To compare the doses to risk organs and treatment target volume with different planning techniques, 3D-CRT, IMRT, VMAT and modified VMAT for the treatment of breast cancer in an anthropomorphic phantom. Method: The treatment plan was performed in the Eclipse™ v.15.6 system by Varian from CT images acquired from phantom. The established prescription dose was 45 Gy in 25 fractions of 1.8Gy/day. Results: For the planning target volume (PTV) coverage, 3D-CRT techniques (FILTER and field-in-field – FIF) showed inferior coverage compared to IMRT and VMAT plans. The 3D-CRT-FIF plan, on the other hand, shows greater homogeneity when compared to 3D-CRT-FILTER. For the contralateral lung, the 3D-CRT plans (FIF, FILTER) have better restrictions when compared with the other plans. On cardiac exposure, the 3D-CRT (FIF, FILTER) plans showed greater benefits when compared with IMRT, VMAT and Modified VMAT techniques. Conclusion: Conventional 3D-CRT techniques (FIF, FILTER) showed lower doses in organs at risk. However, IMRT and VMAT techniques obtained better homogeneity and conformity of the dose delivered to the PTV when compared to conventional techniques.

Key words: radiotherapy, conformal; radiotherapy, intensity-modulated; breast neoplasms; radiation dosage.

 

 

RESUMEN

Introducción: La radioterapia se utiliza en el tratamiento del cáncer de mama. En la planificación de la radioterapia, existen formas de desarrollar el plan de tratamiento, como la radioterapia conformacional 3D (3D-CRT), la radioterapia de intensidad modulada (IMRT) y la arcoterapia volumétrica modulada (VMAT). Objetivo: Comparar las dosis en órganos de riesgo y en el volumen blanco de tratamiento con diferentes técnicas de planificación: 3D-CRT, IMRT, VMAT y VMAT modificada para el tratamiento del cáncer de mama en un fantoma antropomórfico. Método: El plan de tratamiento se realizó en el sistema Eclipse™ v.15.6 de Varian a partir de imágenes de TC adquiridas del fantoma. La dosis de prescripción establecida fue de 45 Gy en 25 fracciones de 1,8Gy/día. Resultados: En cuanto a la cobertura del volumen blanco de planificación (VBP), las técnicas 3D-CRT (filtro - FILTRO y field-in-fieldFIF) demostraron una cobertura inferior en comparación con los planes IMRT y VMAT. El plan 3D-RCT-FIF mostró mayor homogeneidad en comparación con el 3D-RCT-FILTRO. Para el pulmón contralateral, los planes 3D-CRT (FIF, FILTER) obtuvieron mejores restricciones en comparación con los otros planes. En la exposición cardiaca, los planes 3D-CRT (FIF, FILTER) mostraron mayores beneficios en comparación con las técnicas IMRT, VMAT y VMAT modificada. Conclusión: Las técnicas convencionales de 3D-CRT (FIF, FILTER) mostraron dosis más bajas en los órganos de riesgo. Sin embargo, las técnicas IMRT y VMAT obtuvieron una mejor homogeneidad y conformidad de la dosis distribuida en el VBP en comparación con las técnicas convencionales.

Palabras clave: radioterapia conformacional; radioterapia de intensidad modulada; neoplasias de la mama; dosis de radiación.

 

 

INTRODUÇÃO

As estimativas de novos casos de câncer para 2023-2025 evidenciam que o tipo mais incidente em todas as Regiões geográficas do Brasil será o câncer de mama feminino, sendo também o mais frequente na maioria das Unidades Federativas e no Distrito Federal1. A partir desse cenário, a neoplasia representa um desafio para a saúde nacional, uma vez que há uma série de fatores que influenciam na disparidade das taxas de sobrevivência no país, entre os quais está tanto o atraso no diagnóstico quanto a falta de acesso ao tratamento2.

 

A terapia para câncer de mama tem como finalidade erradicar as células tumorais da mama e os linfonodos acometidos pela doença, e prevenir a recorrência de metástase. Para tanto, podem ser adotadas terapias locais, como a cirurgia e a radioterapia, e o tratamento sistêmico – que inclui a terapia endócrina, a de anticorpos, assim como a quimioterapia3. A radioterapia externa, ou teleterapia, consiste na entrega de uma dose por meio de um feixe de radiação ionizante que tem origem em um acelerador linear. Essa energia, na forma de radiação, é depositada no alvo, ou seja, no volume de tratamento4.

 

A radioterapia para o câncer de mama pode ser realizada em todo volume da mama ou em uma parte dela, na parede torácica e nos linfonodos regionais3. O tratamento neoadjuvante com radioterapia pode melhorar significativamente a sobrevida livre de doença sem reduzir a sobrevida global, especialmente para pacientes com receptor de estrogênio positivo e no estágio inicial da doença5. Já a radioterapia adjuvante demonstra melhor controle locorregional, e, além disso, traz benefícios na sobrevida global para os casos de cirurgia conservadora seguida de radioterapia, irradiação nodal regional e radioterapia pós-mastectomia6.

 

Quando se trata do planejamento radioterápico, existem algumas formas de desenvolver o plano de tratamento. Uma das modalidades convencionais é a técnica de radioterapia conformacional tridimensional – do inglês 3D conformal radiation therapy (3D-CRT). Esse método utiliza feixes tangenciais com filtros compensadores de dose ou campos sobrepostos para evitar a exposição do pulmão ipsilateral e a área cardíaca7. Apesar de o tratamento com radiação ionizante apresentar benefícios na curabilidade da doença ao atingir as células tumorais, o tecido normal circunvizinho pode sofrer danos ao ser exposto à radiação causando toxicidades8. A exposição da área cardíaca à radiação ionizante aumenta o risco subsequente de doença coronariana e mortalidade cardíaca9.

 

Com o intuito de prevenir as toxicidades cardíacas intrínsecas ao tratamento radioterápico, surgem novas técnicas de tratamento, como a radioterapia de intensidade modulada, do inglês intensity-modulated radiation therapy (IMRT), e a arcoterapia volumétrica modulada, ou volumetric modulated arc therapy (VMAT)10. Ambas permitem uma entrega de dose precisa, diminuindo as margens do volume-alvo, e melhoram a conformação da energia depositada no volume de tratamento, quando comparadas à modalidade convencional11.

 

A técnica VMAT pode ser utilizada para poupar os órgãos de riscos – ou organ at risk (OAR) em inglês – como a área cardíaca10. Entretanto, sua aplicação deve ser discutida em casos que apresentam uma dose pulmonar aumentada12, a qual pode estar associada a um maior risco de câncer secundário na mama contralateral13. Isso ocorre em função de o espalhamento da radiação ionizante atingir o tecido mamário contralateral, que é radiossensível14.

 

No tratamento da mama, a técnica VMAT entrega a dose a partir de dois arcos parciais, em sentidos opostos (horário e anti-horário)13-15. Considerando as especificidades em relação à dose pulmonar e na mama contralateral na aplicação dessa técnica, a pesquisa apresenta a análise de uma variação dela, recurso empregado de forma rotineira na instituição onde o estudo foi executado, denominada VMAT modificada (VMATMOD), que tem como característica a divisão dos dois arcos parciais em quatro semiarcos parciais na entrega da dose durante a rotação do gantry em seu eixo.

 

É de conhecimento que a escolha da técnica de tratamento usada na radioterapia para o câncer de mama deve ser feita individualmente baseada no equilíbrio entre os riscos e benefícios da modalidade, considerando também as características anatômicas do paciente que podem influenciar na seleção da técnica ideal14. A partir desse cenário, o estudo objetiva comparar as doses nos OAR e no volume-alvo de tratamento com as diferentes técnicas de planejamento: 3D-CRT, IMRT, VMAT e VMATMOD para o tratamento do câncer de mama em um phantom antropomórfico.

 

MÉTODO

Os planos de tratamentos das técnicas 3D-CRT, IMRT, VMAT e VMATMOD para o estudo da entrega de dose de radiação da mama foram realizados por meio da aquisição de imagens tomográficas (equipamento Hi-speed, da marca GE, multislice de 64 canais) a partir de um objeto antropomórfico (phantom) na forma elíptica, o qual simula a anatomia de um tronco humano de estatura média. Considerando que o estudo e a coleta de dados foram realizados a partir de imagens de um phantom, portanto, sem o envolvimento de seres humanos, a pesquisa dispensa a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos. As imagens do Digital Imaging and Communications in Medicine (DICOM) espaçadas de 1,25 mm entre cortes axiais foram inseridas no sistema de planejamento Eclipse (versão™ v.15.6 da Varian, calculado com o algoritmo analítico anisótropico – AAA).

 

Para o delineamento dos OAR e do volume do alvo planejado – do inglês planning target volume (PTV) –, seguiram-se as recomendações do atlas de anatomia do Grupo de Oncologia e Radioterapia – Radiation Therapy Oncology Group (RTOG). Tanto o volume do alvo clínico – ou clinical target volume (CTV) –, o qual englobou todo o tecido mamário e a parede torácica, bem como o PTV foram representados pela mama esquerda. Os seguintes OAR foram delineados: pulmão ipsilateral, pulmão contralateral, medula espinhal, mama contralateral, esôfago, costelas, cadeia linfonodal da mamária interna e área cardíaca (Figura 1).

 

A dose de prescrição estabelecida foi o regime de fracionamento convencional de 45 Gy em 25 frações de 1,8 Gy/dia. Para os planos de IMRT e VMAT/VMATMOD, foi delineada uma estrutura entre a mama e a região da parede torácica com espessura de 1 cm denominada “anel” (na cor verde) com a finalidade de reduzir doses no pulmão ipsilateral, conforme mostrado na Figura 1. Os planos foram calculados para o tratamento no acelerador linear TrueBeam® Stx HD (lâminas de 0,25 mm na região do isocentro), com energia de 6 MV e taxa de dose de 600 MU/min.

 

Figura 1. Delineamento dos órgãos de risco e volume-alvo

 

 

Após o delineamento dos OAR e PTV, as técnicas de tratamento isoladas foram planejadas na seguinte ordem: 3D-CRT (FILTRO e field-in-field – FIF) , IMRT, VMAT e VMATMOD. As avaliações das restrições foram pautadas pelas recomendações do Quantitative Analyses of Normal Tissue Effects in the Clinic (QUANTEC)16 e RTOG17.

 

No planejamento 3D-CRT, optou-se por campos tangentes medial (306°) e lateral (133°), com colimadores de multilâminas e angulações escolhidas com o intuito de minimizar a dose na área pulmonar e mama contralateral conforme preconizado na rotina do 3D-CRT. O plano 3D-CRT-FIF utilizou a técnica FIF para a homogeneização da dose, já o plano 3D-CRT-FILTRO aplicou filtros compensadores no formato de cunha de 45° para obter controle da dose na superfície. No plano de IMRT, optou-se pela técnica sliding-window com seis angulações de gantry (306°, 150°, 330°, 0°, 30° e 90°). O plano VMAT foi elaborado a partir de dois arcos parciais, com a seguinte disposição: ângulo de 306° a 150° no sentido horário, e ângulo de 150° a 306° no sentido anti-horário.

 

Para o planejamento da técnica VMATMOD, houve o deslocamento do isocentro na região próxima aos arcos costais de maneira em que quatro semiarcos bloqueados excluíram a divergência do feixe de radiação no volume do pulmão ipsilateral. Os semiarcos estão dispostos nas seguintes angulações: 306° a 45° sentido horário, 45° a 150° sentido horário, 150° a 45° sentido anti-horário e 45° a 306° sentido anti-horário. Nos planos de IMRT, VMAT e VMATMOD, foram utilizadas as restrições de dose para o volume-alvo e os OAR na otimização dos planos (IMRT e VMAT/VMATMOD), conforme descritos na Tabela 1.

 

Tabela 1. Restrição de dose para os planos de tratamento

PTV/OAR

DOSE DE RESTRIÇÃO

PTV

D100% ≥ 45 Gy

Área cardíaca

V5 Gy ≤ 40%

V25 Gy≤ 10%

Pulmão ipsilateral

V5 Gy ≤ 60%

V20 Gy ≤ 30%

Mama contralateral

DMÁX ≤1,8 Gy

Legendas: PTV = volume do alvo planejado; OAR = órgãos de risco; V = volume que recebe as doses indicadas; D = dose; Gy = Gray.

 

 

RESULTADOS

As avaliações dos planos de tratamentos na mama esquerda envolvem as análises qualitativa e quantitativa das distribuições de isodoses no PTV e dos OAR. Na Figura 2, observa-se que as distribuições de dose de 500 cGy (representado pela cor azul) nas técnicas 3D-CRT (FIF, FILTRO) são restritas à linha inferior dos campos tangenciais e muito próximas ao PTV, ou seja, nota-se um espalhamento mínimo dessas baixas doses. Entretanto, as técnicas de IMRT, VMAT e VMATMOD apresentam maior distribuição de doses baixas (500 cGy representada pela cor azul) nos demais tecidos adjacentes, como pulmão ipsilateral, área cardíaca e mama contralateral.

 

Figura 2. Comparação da distribuição da curva de isodose

 

Entre os critérios de avaliações dos planos, analisou-se o índice de homogeneidade (IH) das distribuições de dose, o qual é recomendado que seja próximo a zero18,19. Outro critério estabelece o índice de conformidade (IC) das distribuições de dose entre 0,95 e não maior do que 218-20. Na Tabela 2, são apresentados os valores dos cálculos de IH, os quais apresentaram uma variação de 5% a 7% no volume-alvo, evidenciando uma correlação de uniformidade aceitável. Ainda na Tabela 2, na análise para os cálculos de IC sobre o volume-alvo, houve uma variação de 1,02 a 1,182, limites aceitáveis. Portanto, os valores obtidos de IH e IC para todas as técnicas de tratamento encontram-se em conformidade com os parâmetros estabelecidos.

 

Tabela 2. Análise quantitativa dosimétrica do PTV

PTV

3D-CRT-FIF

3D-CRT-FILTRO

IMRT

VMAT

VMATMOD

D95% (cGy)

4.500

4.500

4.500

4.500

4.500

Dmédia (cGy)

4.671,9

4.660,6

4.646,6

4.651,2

4.660

Dmáx (cGy)

4.821,8

4.815,2

4.882,7

4.836,2

5.016,5

Curva de prescrição

89%

97%

102,5%

103%

102,5%

Índice de conformidade

1,02

1,037

1,163

1,182

1,149

Índice de homogeneidade

0,06

0,05

0,06

0,06

0,07

Legendas: PTV = volume do alvo planejado; 3D-CRT-FIF = radioterapia 3D conformacional field-in-field; 3D-CRT-FILTRO = radioterapia 3D conformacional FILTRO; IMRT = radioterapia de intensidade modulada; VMAT = arcoterapia volumétrica modulada; VMATMOD = VMAT modificada; D = dose; cGy = centigray.

 

 

Para efeitos de comparações igualitárias entre as técnicas, estabeleceu-se o critério em que a curva de isodose foi definida pelo D95%, isto é, o volume de 95% do PTV deve receber 100% da dose prescrita. Em relação à cobertura do PTV, observa-se que todas as técnicas demonstram cobertura satisfatória e aceitável. A técnica 3D-CRT-FIF mostrou-se vantajosa por manter o gradiente de dose aceitável comparado aos demais planos, em razão dos critérios de modulação adotados para essa técnica quando comparada à técnica 3D-CRT-FILTRO. Ao contrário das técnicas que utilizam o planejamento inverso (IMRT, VMAT, VMATMOD), nestes foram usados os mesmos parâmetros (constantes) de otimização, sem forçar o sistema a atingir melhorias no planejamento. Na Tabela 3, observa-se a avaliação dosimétrica do plano de tratamento que contém uma análise quantitativa dos OAR com a descrição das restrições de doses entre 3D-CRT-FIF, 3D-CRT-FILTRO, IMRT, VMAT e VMATMOD.

 

Tabela 3. Comparação dosimétrica em diferentes planos de tratamento

OAR

Parâmetros

dosimétricos

3D-CRT-FIF

3D-CRT

FILTRO

IMRT

VMAT

VMATMOD

Pulmão

contralateral

DMáx (cGy)

 

5,2

11,9

759,9

841,5

1.161

V5 Gy (%)

0

0

1,44

3,32

10

Pulmão

ipsilateral

DMáx (cGy)

4.240,1

4.274,5

4.232,5

4.386,9

4.471,2

V20 Gy (%)

2,48

2,38

23,68

15,74

5,61

V10 Gy (%)

3,68

3,78

50,57

43,72

20,79

V5 Gy (%)

7,6

6,95

66,96

75,34

50,90

Medula espinhal

DMáx (cGy)

0

0

491,3

584,1

203,6

 

 

Área cardíaca

DMáx (cGy)

3.887,9

3.921,2

3.977,4

4.425,4

3.039,7

DMed (cGy)

105,3

113,9

929,6

1.308,2

402,2

V25 Gy (%)

0,03

0,03

5,27

5,71

0,47

V15 Gy (%)

0,15

0,09

22,91

31,05

3,05

V5 Gy (%)

2,03

1,41

57,96

41,52

20,80

Mama contralateral

DMáx (cGy)

26,1

38,6

830,4

458,8

1.055,1

V3 Gy (%)

0

0

10,75

3

4,6

Legendas: OAR = órgãos de risco; 3D-CRT-FIF = radioterapia 3D conformacional field-in-field; 3D-CRT-FILTRO = radioterapia 3D conformacional FILTRO; IMRT = radioterapia de intensidade modulada; VMAT = arcoterapia volumétrica modulada; VMATMOD = VMAT modificada; D = dose; cGy = centigray; V = volume que recebe as doses indicadas.

 

 

Os resultados da técnica 3D-CRT (FIF, FILTRO) apresentam doses menores no pulmão ipsilateral, mama contralateral e área cardíaca. Sobre a exposição da área cardíaca, os planos 3D-CRT (FIF, FILTRO) apresentaram maiores benefícios ao serem comparados com as técnicas IMRT, VMAT e VMATMOD. A recomendação de restrição do RTOG preconiza que a dose média na área cardíaca seja de 4 Gy. Os planos IMRT e VMAT excederam o limite de dose média na área cardíaca, apenas a VMATMOD apresentou o limiar de dose permissível como mostrado na Tabela 3. O fato demonstra a superioridade da técnica ao compará-la com a IMRT e a VMAT, uma vez que foram utilizados os mesmos parâmetros sem forçar a otimização.

 

Para o pulmão contralateral, os planos de 3D-CRT (FIF, FILTRO) obtiveram restrições aceitáveis ao comparar com os demais planos e as restrições do RTOG. Já no plano de IMRT, o pulmão ipsilateral apresentou V5 Gy de 66,96%, contrariando a recomendação que estabelece que o V5 Gy seja no máximo 60%. Para o pulmão ipsilateral, o plano VMATMOD apresentou melhores resultados nos critérios de dose máxima e V20 Gy comparado às técnicas IMRT/VMAT. A VMAT apresentou a maior contribuição de dose na medula espinhal, em função da disposição dos arcos. Entretanto, na proposta VMATMOD, houve uma redução de cerca de 59% da dose na medula espinhal.

 

Em razão da preocupação com a probabilidade de câncer radioinduzido posteriormente ao tratamento de radioterapia, a radiação exige uma monitorização dessa dose, visto que a mama contralateral é um tecido radiossensível. O RTOG preconiza que a dose máxima na mama contralateral não exceda o limite de 3,10 Gy. Comparados os valores de dose máxima da mama contralateral entre os planos, as técnicas 3D-CRT (FILTRO e FIF) resultaram em limites aceitáveis em função da configuração de campos tangenciais. Entre as técnicas de planejamento inverso, a IMRT foi a que resultou em uma maior contribuição de dose na mama contralateral, seguida da VMATMOD, que apresentou melhor eficácia em minimizar as doses em pulmão ipsilateral e na área cardíaca. A técnica VMAT apresentou a menor dose na mama contralateral entre as técnicas de planejamento inverso, porém ela não obteve o mesmo êxito nos outros OAR (como pulmão ipsilateral, área cardíaca e medula espinhal).

 

DISCUSSÃO

Com objetivo de reduzir as toxicidades intrínsecas à radioterapia, sugere-se a aplicabilidade de diferentes técnicas de tratamento, como a 3D-CRT utilizando FIF, a IMRT com multicampos e a VMAT21. Os resultados em relação à técnica que apresenta maior benefício são divergentes entre os estudos. Ao comparar a técnica 3D-CRT-FIF com a IMRT para pacientes tratadas com radioterapia pós-mastectomia na parede torácica esquerda, Aras et al.22 destacaram que a IMRT resultou em um plano com maior conformidade da dose, e com redução de dose no pulmão ipsilateral e coração, enquanto a técnica 3D-CRT-FIF foi superior em termos de volume de baixa dose. Em contrapartida, Elzawawy e Hammoury23 concluíram que a 3D-CRT-FIF apresenta doses menores no pulmão, mama contralateral e coração, além de subvolumes como a artéria coronária em comparação à técnica de IMRT. Supakalin et al.24 afirmam que as técnicas IMRT e VMAT apresentam doses cardíacas dentro do limite de tolerância V30 Gy abaixo de 10%. Entretanto, apesar de a VMAT demonstrar excelente homogeneidade e conformidade nas curvas de isodose, a técnica resulta em uma dose significativamente maior na mama contralateral, similar ao constatado no presente estudo.

 

A seleção da técnica de planejamento é um aspecto essencial no processo terapêutico. Para tanto, é necessário considerar as características individuais de cada paciente, tal como anatomia25, de forma a garantir a cobertura do alvo e minimizar a exposição dos OAR. Neste estudo, todos os planos de tratamento receberam 100% da prescrição da dose e houve pouca variação do volume-alvo D95% (cGy), pois se trata de um phantom com anatomia favorável. Em casos práticos, o PTV D95% (cGy) apresenta diferenças significativas ao comparar as técnicas de tratamento26.

 

Os IH que apresentaram valores próximos de zero demonstram uma excelente cobertura no PTV. No estudo, os valores variaram de 0,04 (3D-CRT-FIF) a 0,105 (3D-CRT-FILTRO)27. Já os IC que se aproximam de 1 representam uma boa qualidade na distribuição de dose. Neste estudo, os valores variaram de 1,02 (3D-RCT-FIF) a 1,182 (VMAT)27. Os resultados são semelhantes aos de Supakalin et al.24 em seu estudo, o qual analisou diferentes técnicas de planejamento de radioterapia para câncer de mama após cirurgia conservadora, que obteve o IH de 0,755 para VMAT e 0,636 para IMRT; já o IC foi de 0,876 para VMAT e 0,728 para IMRT.

 

Uma das toxicidades tardias mais preocupantes é a cardíaca, uma vez que a exposição do coração durante a radioterapia é inevitável, principalmente em casos que envolvem a irradiação da mama esquerda8. A exposição resulta em uma variedade de toxicidades por vias inflamatórias, dependendo da subestrutura cardíaca exposta28. Para os casos de câncer de mama esquerdo, a artéria coronária descendente anterior esquerda, em inglês left anterior descending artery (LAD), e o ventrículo esquerdo são mais expostos a doses de radiação do que outros subvolumes cardíacos29. O fato é preocupante, pois a LAD é a maior artéria coronária e transporta metade do suprimento sanguíneo do miocárdio30. Logo, um dano em qualquer porção da estrutura pode ocasionar uma doença cardíaca isquêmica grave29. Tal fato se soma ao uso de outras terapias associadas para câncer de mama que também são cardiotóxicas, como as antraciclinas e os fármacos antagonistas de HER231.

 

Sobre a toxicidade pulmonar, a pneumonite induzida por radiação é o principal efeito da radioterapia. Trata-se de um estado inflamatório em que alguns fatores predizem o seu desenvolvimento, entre os quais se destacam a idade maior ou igual a 64 anos, comorbidades pulmonares, quimioterapia concomitante, bem como a técnica de radioterapia aplicada e doses mais altas32. Em relação às doses pulmonares, Chao et al.33 compararam as modalidades de IMRT e VMAT. O resultado evidenciou que a VMAT apresenta doses pulmonares satisfatórias ao compará-la com a técnica IMRT.

 

Em função da exposição da radiação, a mama contralateral tem probabilidade de desenvolvimento de câncer secundário34. Entretanto, isso é influenciado pela anatomia do paciente, há uma variabilidade nas doses da mama contralateral em função das diferenças entre a distância mínima da mama contralateral em relação à mama que será tratada, sendo que, a cada aumento de 1 cm dessa distância, a dose média da mama contralateral diminui cerca de 10% a 15%35.

 

CONCLUSÃO

A partir da análise dos resultados, conclui-se que as técnicas convencionais 3D-CRT (FILTRO e FIF) apresentaram menores doses nos OAR. Contudo, as técnicas IMRT, VMAT, VMATMOD obtiveram melhor homogeneidade e conformidade da dose distribuída no PTV em relação às técnicas convencionais. As distribuições de doses dentro dos limites do PTV nos planos de tratamento estão relacionadas à anatomia favorável da mama, no caso, o objeto phantom. Em condições de rotina clínica, encontram-se os mais diversos tipos de anatomia, sendo necessária a utilização de técnicas complexas com os planejamentos inversos, entre as quais se destaca a VMATMOD para alcançar menores doses na área cardíaca e no pulmão ipsilateral.

 

Nos resultados desta pesquisa, os gradientes das técnicas IMRT/VMAT/VMATMOD apresentaram valores superiores aos das técnicas tradicionais (3D/FIF), apesar disso, vale ressaltar que a ocorrência se justifica pela mesma utilização de parâmetros de otimização das técnicas inversamente moduladas. Uma vez que melhores resultados são possíveis em razão do ajuste no sistema otimizar o plano adicionando critérios de restrições maiores, bem como o uso de estruturas auxiliares no delineamento.

 

Considerando que o objetivo da pesquisa foi correlacionar as diferentes técnicas, optou-se por não ajustar o sistema de planejamento com a finalidade de reotimizar o plano das técnicas de tratamento que são adquiridas a partir do planejamento inverso, no caso IMRT e VMAT. Portanto, assumiu-se como resultado a variabilidade entre os gradientes de dose, pontos quentes e dose nos OAR, uma vez que não foram adicionados critérios de restrições maiores e estruturas auxiliares no delineamento para otimização.

 

A técnica VMATMOD é um recurso usado rotineiramente na instituição, basicamente se diferencia da VMAT tradicional em razão da assimetria dos colimadores, com um deles completamente fechado, evitando, assim, a divergência do feixe de radiação nos OAR, pulmão ipsilateral e área cardíaca, por exemplo.

 

Os resultados da pesquisa servem como base informativa sobre as doses nos OAR e volume-alvo, fornecendo dados para estabelecer um critério de escolha para definição da técnica ideal a depender da anatomia do paciente para o tratamento da radioterapia externa no câncer de mama.

 

AGRADECIMENTOS

Ao serviço de radioterapia CORB em Blumenau, em especial, ao Departamento de Física Médica, sob supervisão do físico-médico Herofen Zaias, que desenvolveu o simulador antropomórfico utilizado no estudo.

 

CONTRIBUIÇÕES

Tatiane Mayla Domingos Prandi, Herofen Zaias, Charlene da Silva e Patrícia Fernanda Dorow contribuíram substancialmente na concepção e/ou no planejamento do estudo; na obtenção, análise e interpretação dos dados; na redação e revisão crítica. Juliana dos Santos Müller e Larissa Palhano da Silva Blasius contribuíram na redação e/ou revisão crítica. Todos os autores aprovaram a versão final a ser publicada.

 

 

DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES

Nada a declarar.

 

 

FONTES DE FINANCIAMENTO

Não há.

 

 

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Recebido em 8/5/2023

Aprovado em 20/6/2023

 

Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777

 

 

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