ARTIGO ORIGINAL

 

Construção de um Dashboard para Análise dos Dados de Câncer na Macrorregião de Saúde do Sudeste de Minas Gerais

Construction of a Dashboard for the Analysis of Cancer Data in the Southeast Health Macroregion of Minas Gerais

Construcción de un Dashboard para el Análisis de Datos de Cáncer en la Macrorregión de Salud del Sudeste de Minas Gerais

 

 

https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2023v69n4.4285

 

João Pedro Medeiros Gomes1; Mário Círio Nogueira2

1-2Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Faculdade de Medicina. Juiz de Fora (MG), Brasil.

1E-mail: jpmedeirosg@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-5576-2481

2E-mail: mario.cirio.nogueira@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-9688-4557

 

Endereço para correspondência: João Pedro Medeiros Gomes. Rua Chanceler Oswaldo Aranha, 135/801 – São Mateus. Juiz de Fora (MG), Brasil. CEP 36025-007. E-mail: jpmedeirosg@gmail.com

 

 

RESUMO

Introdução: Dashboards são ferramentas interativas de visualização de dados que simplificam grandes quantidades de informações. No contexto da saúde, eles são utilizados em diversas situações como em dados relativos ao câncer no país, ainda que, normalmente, haja disponibilidade somente para análise de Estados e Capitais. Objetivo: Descrever a construção de um dashboard relacionado ao câncer na Macrorregião de Saúde Sudeste de Minas Gerais (MSSMG). Método: Construção passo a passo de um dashboard com uso de código aberto e sua utilização para análise descritiva de dados relacionados à mortalidade por neoplasias malignas e exames de triagem para o câncer de mama e do colo do útero na MSSMG entre os anos de 2010-2019. Resultados: Foi produzido um dashboard com dados oficiais sobre a mortalidade por câncer, cobertura de exames preventivos e variáveis socioeconômicas, que permite uma análise extensa sobre o tema na Região. Com o uso dessa ferramenta, verificou-se que a mortalidade por câncer entre homens é elevada e o câncer de pulmão foi a principal causa de morte. Ainda foi possível analisar visualmente a distribuição espacial da taxa de mortalidade padronizada e da cobertura média do período dos exames de citologia do colo do útero e da mamografia. Conclusão: Criação de um dashboard abrangente sobre câncer na MSSMG e compartilhamento dos resultados obtidos. O painel demonstrou versatilidade ao simplificar processos estatísticos e visualizações, facilitando a formulação de ideias, hipóteses, e oferecendo informações claras e intuitivas.

Palavras-chave: epidemiologia; neoplasias; análise espacial; saúde pública; registros de mortalidade.

 

 

ABSTRACT

Introduction: Dashboards are interactive data visualization tools that simplify large amounts of information. In the context of health, they are used in different settings, such as cancer related data in the country, although, usually, only analyzes of States and Capitals are available. Objective: Describe the construction of a cancer-related dashboard in the Southeast Health Macroregion of Minas Gerais (MSSMG). Method: Step-by-step study of the construction of an open-source code dashboard and its utilization for descriptive analysis of data related to mortality by malignant neoplasms and breast and cervical cancer screening in MSSMG between 2010 and 2019. Results: A dashboard was produced with official data on cancer mortality, coverage of preventive exams and socioeconomic assessment, which allows an extensive analysis for the region. Higher mortality by cancer in men was found with the utilization of this tool, and that lung cancer was the main cause of death. It was also possible to visually analyze the spatial distribution of the standardized mortality rate and the mean coverage of cervical cytology and mammography exams in the period. Conclusion: Creation of a comprehensive dashboard on cancer at MSSMG and sharing the results. The panel has been shown to be versatile by simplifying statistical processes and visualization, facilitating the formulation of ideas, possibilities and offering clear and intuitive information.

Key words: epidemiology; neoplasms; spatial analysis; public health; mortality registries.

 

 

RESUMEN

Introducción: Dashboards son herramientas interactivas de visualización de datos que simplifican grandes cantidades de información. En el ámbito de la salud, se utilizan en diferentes contextos, como datos relacionados con el cáncer en el país, aunque, normalmente, solo se dispone de análisis de Estados y Capitales. Objetivo: Exponer la construcción de un panel de control relacionado con el cáncer en la Macrorregión de salud del Sudeste de Minas Gerais (MSSMG). Método: Construcción paso a paso de un dashboard usando código abierto y el uso de esta herramienta para el análisis descriptivo de datos relacionados con la mortalidad por neoplasias malignas y los exámenes de detección de cáncer de mama y cuello uterino en la MSSMG entre los años 2010-2019. Resultados: Se elaboró ​​un dashboard con datos oficiales de mortalidad por cáncer, cobertura de exámenes preventivos y evaluaciones socioeconómicas, que permite un análisis amplio sobre el tema en la región. Con el uso de esta herramienta se percibió que existe una mayor mortalidad por cáncer entre los hombres y que el cáncer de pulmón fue la principal causa de muerte. También fue posible analizar visualmente la distribución espacial de la tasa de mortalidad estandarizada y la cobertura media del período de los exámenes de citología cervical y mamografía. Conclusión: Creación de un dashboard integral sobre cáncer en la MSSMG y intercambio de los resultados obtenidos. El panel demostró versatilidad al simplificar procesos estadísticos y visualizaciones, facilitando la formulación de ideas, posibilidades y ofreciendo información clara e intuitiva.

Palabras clave: epidemiología; neoplasias; análisis espacial; salud pública; registros de mortalidad.

 

 

INTRODUÇÃO

Dashboards são ferramentas interativas de visualização de dados com objetivo de prover meios de simplificar grandes quantidades de dados com o uso de representações visuais, que trazem informações resumidas da maneira mais eficiente possível1. Eles podem ser utilizados em diversos contextos, inclusive na área da saúde2,3, podendo assumir diferentes formatos e funções, o que engloba o uso, por exemplo, de gráficos, tabelas e mapas, trazendo informações de um país ou de pequenas Regiões. Dessa maneira, dashboards produzidos por pesquisadores com finalidades específicas podem responder a diferentes perguntas com informações relevantes3, com a incidência de alguma doença ou os serviços prestados em uma unidade de atenção básica de saúde.

 

O papel dessas ferramentas cresceu com os desafios trazidos pela pandemia da covid-19, pois esta levou a uma ampliação da discussão e da necessidade de dados em saúde em um contexto temporal e geográfico amplo, por exemplo, sobre a caracterização da evolução da pandemia em países, Capitais metropolitanas e pequenos municípios. Essa necessidade da disponibilização e da interpretação dos dados levou à construção dos mais diversos tipos de visualizações de dados em saúde, inspirando a produção de dezenas de dashboards e publicações em redes sociais, cada uma voltada a públicos específicos, utilizando métodos para informar melhor o leitor final2,4-9.

 

No Brasil, alguns dashboards estão disponíveis para contextos específicos de saúde. O Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB)10 é um exemplo de plataforma que disponibiliza dados públicos processados sobre a atenção básica brasileira, e informações ainda mais fundamentais para o funcionamento do serviço de saúde de uma área geográfica delimitada ou podem ser acessadas facilmente pelos usuários na plataforma e-Gestor ou e-SUS11,12 em uma unidade básica específica. Indicadores de sífilis e HIV13,14 também são facilmente encontrados para visualização de tabelas e gráficos, e dados relacionados à síndrome respiratória aguda grave (SRAG) e dengue podem ser encontrados em infográficos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)15,16.

 

Essa disponibilização de informações associadas às visualizações gráficas auxilia na concretização de uma saúde mais democrática e traz melhor percepção quanto aos diversos contextos de saúde retratados17. Além disso, a disponibilização de dashboards específicos para cada área da saúde pode contribuir para a elaboração de políticas públicas mais efetivas e para a melhoria da qualidade dos serviços de saúde prestados à população.

 

O câncer é uma das doenças de grande magnitude e transcendência que afeta drasticamente a saúde das pessoas, possuindo impacto significativo na qualidade de vida e na morbimortalidade de uma população. No Brasil, implicou uma perda estimada em 3154,45 DALY (do inglês: disability-adjusted life years – anos de vida ajustados por incapacidade) por mil habitantes e uma taxa padronizada por idade de 114,52 mortes por mil habitantes em 201918,19, e a estimativa para cada ano do triênio 2023-2025 é de 704 mil casos novos20. O Instituto Nacional de Câncer (INCA) disponibiliza amplamente dados sobre o câncer, com estimativas atualizadas por publicações anuais, e também um dashboard relacionado à mortalidade causada pela doença20,21. Esse dashboard, intitulado “Atlas On-line de Mortalidade”21, desenvolvido entre 1996 a 2014, possui diversas funcionalidades e ampla gama de variáveis disponíveis. Há de se considerar que o fato de ser uma representação voltada para todo o país acaba sendo útil para análise descritiva de Estados e Capitais, mas possui limitações quando se deseja analisar Macrorregiões e Microrregiões de saúde. Ainda, o INCA permite acesso a dados relativos ao Sistema de Informação do Câncer do Colo do Útero (Siscolo), Sistema de Informação do Câncer de Mama (Sismama), Sistema de Informação do Câncer (Siscan) e Painel Oncologia22, que apresentam dados oficiais em nível municipal, mas sem os mesmos recursos gráficos disponíveis em painéis de dados, muito úteis para uma análise descritiva de pequenas Regiões.

 

Este estudo apresenta a produção de um dashboard relacionado à mortalidade por câncer e cobertura de rastreamento dos cânceres de mama e colo do útero e outras variáveis relacionadas, no contexto demográfico e espacial da Macrorregião Sudeste de saúde de Minas Gerais (MSSMG). Em seguida, são introduzidos resultados descritivos a partir da análise feita com o dashboard. Acredita-se que essa ferramenta possa ser útil para fornecer informações relevantes que possam inspirar intervenções efetivas e estudos na área da saúde no contexto local.

 

MÉTODO

O processo de produção de um dashboard depende de diversos fatores. Nesse artigo, serão discutidas com maior relevância questões relacionadas ao usuário final, ao uso e ao nível de complexidade do painel. É importante pontuar inicialmente que o objetivo da criação de um painel desse tipo é produzir um conteúdo que auxilie ao máximo o usuário final, promovendo uma forma facilitada de análise dos dados que exigiria maior tempo e risco de erros no processo de produção. Como usuários finais de dashboards em geral, tem-se: os próprios pesquisadores que produziram o painel, alunos e profissionais das mais diversas áreas, professores, público geral e gestores. Quanto ao uso da ferramenta, esse tipo de painel pode ter utilidades diversas, como, por exemplo, para monitoramento de doenças em nível estatal e de vigilância em saúde, e até como recurso metodológico em sala de aula. Da mesma forma, o nível de complexidade dependerá da expertise dos criadores que, de acordo com a capacidade técnica, podem produzir visualizações que ajudem alcançar o objetivo final de auxiliar o usuário a analisar dados específicos.

 

No caso do dashboard apresentado neste estudo, foi pensada a produção de uma ferramenta com usuário final diverso, abrangendo os próprios pesquisadores, alunos cursando disciplinas relacionadas à vigilância em saúde, profissionais de saúde da Macrorregião e gestores municipais/regionais. O uso foi relacionado à descrição dos aspectos da mortalidade de câncer na Região e no período analisados quanto à demografia, a causas específicas e distribuição espacial e à descrição da cobertura dos exames de mamografia e colpocitologia no que se refere à distribuição espacial. Tendo em vista o conhecimento quanto ao perfil desses usuários e o proposto uso final, foi possível conceitualizar de antemão quais variáveis seriam necessárias e quais tratamentos estatísticos e recursos gráficos poderiam ser realizados.

 

Foram obtidos dados de mortalidade no período, população e mapas da Região por meio dos seguintes pacotes do R Project for Statistical Computing (R)23, versão 4.2.3 e suas respectivas bases de dados: microdatasus – Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS)24; brpop – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)25 e DATASUS26; e geobr – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)27. Além disso, outros dados foram adquiridos por meio dos sites oficiais diversos: Censo de 2010 (IBGE)28, cobertura da atenção básica (SISAB)29, cobertura de planos de saúde (Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS)30, Superintendências/Gerências de saúde (DATASUS)31 e cobertura do rastreamento de cânceres femininos (Sistema de Informação Ambulatorial – SIA)32.

 

Quanto ao nível de complexidade do dashboard, tendo em vista que os usuários finais seriam pessoas com formação na área de saúde, foi decidido o uso de algumas ferramentas estatísticas para tratamento de dados e visualizações gráficas. Assim, foram utilizadas estatísticas de tendência central e dispersão de indicadores de saúde, como as taxas de mortalidade, além de métodos de apresentação e visualização de dados como tabelas, gráficos e mapas. Foram utilizadas medidas de associação, como razão de mortalidade padronizada (RMP), além de formas de visualizar essas medidas, com uso de mapas interativos.

 

Ressalta-se que a qualidade da aplicação final está intimamente relacionada à ferramenta utilizada para sua criação, à expertise do programador e à sua experiência nesse processo. Diferentes ferramentas, como o Excel, o Google Spreadsheets, o Google Data Studio, o Microsoft Power BI e linguagens de programação como R e Python, podem gerar resultados semelhantes, dependendo da habilidade dos usuários1. Neste trabalho, optou-se pela linguagem de programação R em virtude da familiaridade da equipe com essa ferramenta, que permite a utilização otimizada da memória do computador, reprodução simples e acesso direto aos dados, além de ser um programa livre desenvolvido de modo colaborativo.

 

Foram utilizadas diversas bibliotecas para a construção do dashboard, sendo a interface do usuário e os códigos bases desenvolvidos dentro do framework do pacote shiny e reproduzidos pelo pacote flexdashboard. Os mapas e gráficos foram produzidos pelos pacotes ggplot2, ggridges e mapview, enquanto o processamento espacial foi realizado pelo pacote sf. Todo o processamento e tratamento dos dados foram feitos por meio do pacote tidyverse.

 

Este estudo constitui uma análise descritiva transversal e longitudinal. Abrange o período de primeiro de janeiro de 2010 a 31 de dezembro de 2019, quando analisados dados de mortalidade, e primeiro de janeiro de 2008 até 31 de dezembro de 2017, quando analisados dados de cobertura de exames preventivos. Constitui área de abrangência a MSSMG, composta por 94 municípios e 19.401,60 km² de extensão geográfica. Os dados de mortalidade foram filtrados utilizando-se a décima Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)33 C00 a C97 e D46, de acordo com o documento Indicadores e Dados Básicos de Saúde da Rede Interagencial de Informações para a Saúde34.

 

Os resultados analisados foram: (1) mortalidade por todas neoplasias malignas; (2) mortalidade por neoplasias malignas mais frequentes; (3) distribuição demográfica por sexo e idade de todas e das mais frequentes neoplasias malignas; (4) comparação da frequência absoluta entre os anos de 2010 e 2019 por neoplasia maligna; (5) distribuição espacial das neoplasias malignas; (7) distribuição espacial da cobertura de mamografias e exames colpocitológicos.

 

Os resultados foram descritos em valores absolutos e relativos. As informações relativas foram expressas em porcentagem, RMP, ou taxas, as quais foram padronizadas por idade e calculadas por 100 mil habitantes. Quando necessário, os dados relacionados à idade foram agregados em intervalos de cinco anos até a faixa etária de 80 anos, após a qual, foram agrupados na categoria "80+".

 

No que se refere ao tratamento estatístico, as taxas brutas foram calculadas pela frequência de observações dividida pela soma da população dos municípios no período. As taxas padronizadas foram calculadas usando a nova população mundial padrão35, com o auxílio do pacote epitools, enquanto os óbitos esperados, necessários para estimar as RMP, foram calculados com o auxílio do pacote SpatialEpi. A RMP foi calculada pela razão entre os óbitos observados e os esperados. Quanto às taxas de cobertura de exames de rastreamento, elas foram estimadas conforme descrito em artigo anteriormente publicado, estando de acordo com os cálculos preconizados pelo INCA36.

 

Esta pesquisa usou dados secundários disponíveis publicamente, por isso foi dispensada de aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa, conforme a Resolução do Conselho Nacional de Saúde n.º 510/201637.

 

RESULTADOS

A estrutura básica do dashboard é dividida em uma barra de navegação localizada superiormente e um espaço restante para acomodação de visualizações e outras informações. Na barra de navegação, há opções para escolher qual página visitar e, caso sejam de temas semelhantes, são agrupadas em um menu de seleção. Nem todas as páginas serão abordadas neste artigo, já que possuem uma infinidade de resultados que não são de interesse para este estudo (Figura 1).

 

Figura 1. Captura de tela da primeira página do dashboard

Nota: Pode-se ver em azul a barra de navegação localizada superiormente e um espaço abaixo, neste caso, utilizado para informar a produção do dashboard e suas informações disponibilizadas.

 

 

As páginas disponíveis são: sobre; dicionário; mortalidade geral; mortalidade por sexo; comparação por período; mapas; cobertura citologia colo do útero e cobertura de mamografia (Tabela 1).

 

Tabela 1. Descrição das páginas disponíveis, funções e recursos gráficos utilizados

Página

Função

Recursos gráficos

Sobre

Descrever os dados, período analisado, tratamento de dados e autores

 

Dicionário

Descrever o significado de cada uma das variáveis disponíveis para análise

Tabela

Mortalidade geral

Apresentar a mortalidade agregada dos diferentes tipos de cânceres, para ambos os sexos, faixas etárias e períodos

Mapa de árvore

Tabela

Mortalidade por sexo

Apresentar a distribuição da mortalidade de diferentes tipos de câncer em ambos os sexos, faixas etárias e períodos

Pirâmide etária

Gráfico de densidade

Gráfico de barras relativo

Tabela

Comparação entre períodos

Permitir fácil comparação entre períodos quanto aos diferentes tipos de cânceres por sexos, faixas etárias e períodos

Gráficos de barra

Tabela

Mapas

Demonstrar a distribuição espacial das variáveis por Microrregiões nos dois quinquênios e decênio analisados

Mapas

Cobertura da citologia do colo do útero

Mapa interativo que demonstra a distribuição e os valores de cobertura da variável com seleção do período desejado

Mapa

Tabela

Cobertura da mamografia

Mapa interativo que demonstra a distribuição e os valores de cobertura da variável com seleção do período desejado

Mapa

Tabela

 

 

Em função da infinidade de possíveis variações e apresentações gráficas geradas pela capacidade de seleção de variáveis e filtros, os resultados apresentados serão limitados. No entanto, caso seja de interesse, todas as possibilidades de análises estão disponíveis em https://jpmedeirosg.shinyapps.io/dash_cancer_rbc/.

 

No período analisado, foram encontradas 19.636 mortes por neoplasias malignas, das quais a maioria ocorreu no sexo masculino: 10.761 homens e 8.875 mulheres. A maior parte dos óbitos, 12.261, aconteceu no segundo quinquênio analisado, 2015-2019, e 9.255 aconteceram no quinquênio 2010-2014. A maioria das mortes aconteceu em pessoas maiores de 60 anos: 13.922; entre pessoas com menos de 60 anos, houve 5.714 mortes.

 

Comparação entre os anos de 2010 e 2019 quanto à neoplasia maligna por sexo

Nessa comparação, em ambos os sexos, as cinco principais causas de óbitos foram, respectivamente, em 2010, o câncer dos brônquios e pulmões, seguido dos cânceres de mama, de próstata, de estômago e de esôfago (Figura 2A). Em 2019, notam-se algumas modificações em relação a essa incidência, pois, apesar de o câncer de brônquios e pulmões se manter com maior frequência, em sequência tem-se os cânceres de mama, de próstata, de estômago e de cólon (Figura 2B). Essa análise, quando realizada por sexo, demonstra que, entre homens, no ano de 2010, o câncer de brônquios e pulmões continua sendo a maior causa, seguido dos cânceres de próstata, de estômago, de esôfago e, em quinto lugar, de encéfalo e de pâncreas com mesmo número de mortes (Figura 2C). O ano de 2019 manteve essa mesma distribuição com relação aos quatro tipos mais frequentes. No entanto, em quinto lugar, se apresenta a classificação sem especificação de localização. No sexo feminino, em 2010, os mais frequentes foram os cânceres de mama, de brônquios e pulmões, de estômago, do colo do útero, de fígado e das vias biliares intra-hepáticas. Já em 2019, o câncer de mama lidera, seguido pelos cânceres de brônquios e pulmões, de cólon, de pâncreas e os sem especificação de localização (Figura 2D).

 

Figura 2. Tree map de causa de mortes por código de neoplasia maligna nos períodos de 2010-2014, 2015-2019 e 2010-2019 em ambos os sexos. Comparação entre os anos de 2010 e 2019 por causa de mortes e código de neoplasia maligna (A); Ambos os sexos (B); C: Sexo masculino (C); Sexo feminino (D)

 

 

A pirâmide etária evidencia que, no período de 2010-2019, a maioria das mortes se concentraram na faixa etária superior a 60 anos. Nota-se que há um aumento progressivo da frequência de óbitos até a faixa etária de 56-60 anos, frequências semelhantes entre esta e a faixa de 76-80 anos, e a maior frequência na faixa de 80 anos e acima (Figura 3A). 

 

No gráfico de densidade (Figura 3B), separado pelas dez causas de óbito mais frequentes em ambos os sexos, percebe-se que a maioria dessas causas possui distribuição semelhante à curva normal, com assimetrias mais à esquerda ou à direita, dependendo da causa. É ainda possível perceber alguns platôs, como, por exemplo, no câncer de esôfago feminino e de cólon masculino e feminino, e uma curva anômala no câncer de mama masculino, em razão do pequeno número de observações. 

 

Quando se observa a proporção das causas entre os sexos (Figura 3C), é possível notar, além das diferenças inerentes ao sexo, um maior acometimento aos homens em quase todos as principais causas. As mulheres possuem somente maior proporção nos cânceres de cólon e pâncreas. 

 

Figura 3. Pirâmide etária de mortes por neoplasia malignas (A); gráfico de densidade das dez maiores causas de mortes por neoplasia maligna e sexo (B); proporção sexual entre as dez maiores causas de mortes por neoplasia maligna (C)

Legenda: CID-10 = décima Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde.

 

 

Ao analisar as taxas dos períodos, verifica-se uma variação da taxa de mortalidade padronizada por 100 mil habitantes entre os valores máximos e mínimos no decênio de 50,32 a 144,94. Observando o padrão de distribuição espacial, percebem-se valores menores próximo de Ubá e ao Oeste da Região na fronteira com o Estado do Rio de Janeiro, e maiores na fronteira Leste com o mesmo Estado. É necessário ressaltar que esses resultados não são apoiados por análises aprofundadas e essa visualização teria como função gerar perguntas científicas e apoiar a construção de pesquisas relacionadas.

 

Entre os anos de 2008-2017, a média da cobertura do exame citológico do colo do útero foi superior a 80%, principalmente em Regiões próximas de Ubá e no Oeste da Região (Figura 4B). Regiões com alta cobertura também aparecem pela Região, mas sem um agrupamento visual perceptível. Da mesma maneira, baixos valores também se encontram visualmente dispersos. 

 

Nesse mesmo período, a cobertura da mamografia demonstra um padrão em que praticamente toda a Região demonstra valores abaixo dos 80%, sendo que as únicas duas cidades com valores acima de 80% estão localizadas próximas à cidade de Ubá (Figura 4C). Cidades ao Oeste e ao Sul próximas à fronteira com o Estado do Rio de Janeiro parecem agrupar as piores coberturas da Região.

 

Figura 4. Mapa da distribuição das taxas padronizadas na Macrorregião de Saúde Sudeste de Minas Gerais no período de 2010-2019 (A); mapa da distribuição espacial da cobertura dos exames preventivos de citologia do colo do útero (B); mamografia entre 2008-2017 (C)

 

 

DISCUSSÃO

Este artigo apresentou a construção de um dashboard e um exemplo de sua utilização, com a produção de resultados sobre dados relativos a neoplasias malignas na MSSMG entre os anos de 2010 e 2019. Essa amostra de resultados demonstra a versatilidade gerada pelo uso de métodos de visualização de dados que permitem modificações rápidas que, de outra maneira, causariam um trabalho repetitivo e intenso. Ainda, este estudo traz uma análise de uma Macrorregião de saúde não contemplada em um dashboard disponível21, o que mostra como esse tipo de instrumento pode ser útil para trazer benefícios para áreas específicas, muitas vezes não facilmente estudadas. 

 

A criação de um dashboard é um processo desafiador. Durante a sua construção, é preciso tomar decisões quanto à apresentação final do conteúdo, tais como quando exibir valores numéricos e tabelas, e quando utilizar visualizações; qual o nível de interação que deve ser permitido; quanto de informação deve ser incluída em uma única página; além de personalizar a ferramenta para que seja agradável e informativa para o usuário1.

 

Para tomar essas decisões, foi seguido o caminho de eleger o usuário final, a utilidade e o nível de complexidade a ser apresentado. A importância de ter esses itens em mente é equivalente à necessidade de um planejamento de uma pesquisa científica, com desenvolvimento de uma pergunta científica que virá ou não a ser respondida por meio da aplicação de um método previamente estipulado38. Assim, o produto final possui propósito definido, facilitando sua produção.

 

Para escolher a forma de apresentação dos dados, optou-se por disponibilizar tanto visualizações quanto tabelas interativas na maioria das vezes. Nas visualizações interativas, o usuário tem a opção de selecionar filtros e navegar com o mouse de modo a visualizar valores numéricos e informações adicionais relacionadas. Se o usuário quiser os dados de maneira não processada, pode acessar as tabelas facilmente. Visualizações não interativas foram utilizadas apenas quando limitações técnicas foram encontradas. Esses componentes destacam a natureza analítica do dashboard, permitindo a geração de perguntas e ideias relevantes para o usuário final1.

 

De maneira semelhante ao padrão mundial, quando se exclui cânceres ligados a sexo, há uma maior mortalidade proporcional entre homens em quase todas as localizações mais comuns39. Contudo, na MSSMG, os cânceres de cólon e de pâncreas aparecem em maior proporção em mulheres, um fato curioso, já que se espera que fatores genéticos, hormonais e comportamentais levem à maior mortalidade masculina40

 

A aglutinação espacial de maiores ou menores taxas de câncer em áreas diferentes leva à necessidade de produção de estudos que analisem fatores associados a essa heterogeneidade espacial. Nesse caso, para entender por que taxas padronizadas se concentram em menores valores em municípios próximos de Ubá, ou em maiores valores quando próximos do Leste da Região na fronteira com o Estado do Rio de Janeiro (Figura 4), estudos espaciais podem ser necessários41

 

Da mesma maneira, é interessante analisar a distribuição espacial da média da cobertura do exame citopatológico do colo do útero e da mamografia no período disponível e observar que muitas Microrregiões com menores taxas de mortalidade também apresentam maiores taxas de cobertura. Esse padrão pode ser observado novamente em Microrregiões próximas de Ubá. A capacidade de rastreamento e diagnóstico está intimamente relacionada à mortalidade de várias neoplasias malignas42–44 e, embora as taxas de cobertura abordadas neste estudo se refiram a cânceres específicos, podem ser um indicativo da qualidade dos serviços de saúde regional. Um bom serviço local de atenção primária e secundária é capaz de realizar intervenções que estimulam medidas preventivas em seus usuários por diferentes vias. Essa atenção, por sua vez, tem a capacidade de reduzir o risco individual ao atuar em fatores como obesidade, diabetes mellitus, tabagismo e adesão à realização de exames preventivos43,45-47.

 

No que diz respeito às limitações encontradas na construção do dashboard, destacam-se dois pontos importantes: a origem dos dados e seus inerentes vieses, e a falta de avaliação do resultado final por parte dos usuários. Em relação ao primeiro ponto, a confiabilidade e a relevância dos resultados encontrados estão intrinsecamente ligadas à qualidade dos dados utilizados. Por mais que as notificações de óbitos tenham apresentado melhora em sua qualidade e confiabilidade48, conforme mencionado anteriormente, muitas mortes na Região estudada foram registradas como sem especificação de localização, o que sugere que diversos óbitos podem não ter sido devidamente contabilizados por inadequações no preenchimento de atestados de óbito49.

 

Quanto à impossibilidade de avaliação do resultado final, a possibilidade de receber feedback dos usuários durante e após a produção é uma forma de otimizar o resultado e torná-lo mais relevante. Uma forma de obter feedback sobre o dashboard é promover seu uso por gestores, profissionais e estudantes da área da saúde, incentivando e criando um canal para críticas e sugestões.

 

Apesar das limitações mencionadas, o objetivo do dashboard de fornecer visualizações e análises foi alcançado. A natureza analítica do painel permite estudar os dados apresentados de forma mais aprofundada e personalização, utilizando filtros, ordenações, mapas e gráficos. O dashboard se torna uma ferramenta valiosa para explorar os dados de forma interativa, possibilitando a descoberta de padrões, tendências e relações que podem orientar tomadas de decisão e ações futuras. Ao permitir a manipulação e a visualização dos dados de maneira dinâmica, o painel oferece uma oportunidade única de investigação e aprofundamento nos diferentes aspectos abordados, contribuindo para a compreensão mais ampla do cenário em estudo. 

 

Dessa forma, o dashboard não apenas fornece insights imediatos, mas também serve como uma fonte contínua de questionamentos e reflexões, impulsionando a exploração e o aprimoramento do conhecimento sobre a área de interesse. Ao estimular a análise dos dados de maneira mais profunda e a produção de hipóteses que podem ser posteriormente investigadas, o painel contribui para o avanço de pesquisas e a tomada de decisões melhores embasadas17. Além disso, ao fornecer informações relevantes e acessíveis, o dashboard pode subsidiar a formulação de políticas públicas mais efetivas e direcionadas às necessidades da população local.

 

CONCLUSÃO

Neste artigo, foi descrita a criação de um dashboard abrangendo dados relacionados aos cânceres na MSSMG e foram compartilhados alguns dos resultados obtidos por meio de sua utilização. Essa produção foi realizada a partir da seleção de usuário final – um passo mais simples e direto – seguida do árduo processo de entendimento de sua possível utilidade e seleção da apresentação visual dos dados. Foram apresentadas a versatilidade do painel e a sua capacidade de fornecer informações de forma otimizada, simplificando os processos estatísticos e a criação de visualizações que facilitam a experiência do usuário, permitindo a formulação de ideias e hipóteses. Apesar das limitações relacionadas à qualidade dos dados oficiais e seu preenchimento adequado, além da impossibilidade de avaliação da aplicação por parte de outros usuários, o dashboard desenvolvido mostrou-se uma ferramenta útil para explorar e analisar os dados sobre cânceres na MSSMG. Ao apresentar informações de maneira clara e intuitiva, o painel oferece aos usuários a possibilidade de acessar e compreender os dados de forma eficiente, minimizando a necessidade de realizar procedimentos estatísticos complexos ou de criar visualizações a partir do zero.

 

 

CONTRIBUIÇÕES

Ambos os autores contribuíram substancialmente na concepção e/ou no planejamento do estudo; na obtenção, análise e/ou interpretação dos dados; na redação e/ou revisão crítica; e aprovaram a versão final a ser publicada.

 

 

DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES

Nada a declarar.

 

 

FONTES DE FINANCIAMENTO

Não há.

 

 

REFERÊNCIAS

1.         Bach B, Freeman E, Abdul-Rahman A, et al. Dashboard design patterns. IEEE Trans Vis Comput Graph. 2023;29(1):342-52. doi: http://dx.doi.org/10.1109/TVCG.2022.3209448

2.         Dong E, Du H, Gardner L. An interactive web-based dashboard to track covid-19 in real time. Lancet Infect Dis. 2020;20(5):533-4. doi: http://dx.doi.org/10.1016/S1473-3099(20)30120-1

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Recebido em 17/8/2023

Aprovado em 13/11/2023

 

Editora-associada: Jeane Tomazelli. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-2472-3444

Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777

 

 

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