ARTIGO ORIGINAL
O Impacto da Covid-19 no Diagnóstico e Tratamento do Câncer de Próstata no Paraná
The Impact of COVID-19 on the Diagnosis and Treatment of Prostate Cancer in Paraná
El Impacto del COVID-19 en el Diagnóstico y Tratamiento del Cáncer de Próstata en Paraná
https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2024v70n3.4688
Layra Paionk de Lima1; Isabela Bueno Bizerra2; Patrícia Costa Mincoff Barbanti3
1-3Universidade Cesumar, Curso de Medicina. Maringá (PR), Brasil.
1E-mail: layrapaionkdelima@outlook.com. Orcid iD: https://orcid.org/0009-0009-7609-2881
2E-mail: isabelabb0@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0009-0000-8120-2904
3E-mail: patricia.mincoff@docentes.unicesumar.edu.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-7679-6218
Endereço para correspondência: Layra Paionk de Lima. Rua Londrina, 576, apto. 202 – Jardim Aclimação. Maringá (PR), Brasil. CEP 87050-500. E-mail: layrapaionkdelima@outlook.com
RESUMO
Introdução: É inquestionável o impacto que a pandemia da covid-19 teve sobre as mais diversas áreas da saúde, porém pouco sabe-se, ainda, em números, sobre o efeito que a doença e o isolamento causaram nos pacientes oncológicos. Objetivo: Analisar o impacto da pandemia no diagnóstico e tratamento do câncer de próstata em hospitais especializados do Norte e Noroeste do Paraná, comparando os períodos pré-pandêmico e pandêmico (anos de 2019, 2020 e 2021). Método: Estudo transversal, quali e quantitativo, de caráter ex-post-facto. Foram selecionados homens de 50 a 70 anos com o diagnóstico de câncer de próstata e, posteriormente, o instrumento de coleta de dados foi utilizado para identificar se houve diferença significativa no número de diagnósticos, agravos de saúde, desfechos clínicos e falha na adesão do tratamento. Para a análise de dados, foram utilizados o teste qui-quadrado de Pearson e a análise post hoc com correção no valor de p. Resultados: Observou-se que a pandemia afetou de forma significativa o número de consultas, principalmente em 2020, porém, em relação a outras variáveis, não houve prejuízo. Conclusão: Não houve falha na adesão ao tratamento desses pacientes, o que contribuiu para que muitos tivessem desfechos positivos em relação ao curso da neoplasia.
Palavras-chave: COVID-19; Neoplasias da Próstata/diagnóstico; Terapia Neoadjuvante; Protocolos Antineoplásicos; Institutos de Câncer.
ABSTRACT
Introduction: The impact of the COVID-19 pandemic on various health areas is undeniable, yet little is known, in numbers, about the effects that the disease and the ensuing isolation had on oncological patients. Objective: To analyze the impact of the pandemic on the diagnosis and treatment of prostate cancer in specialized hospitals in the North and Northwest of Paraná, comparing the pre-pandemic and pandemic periods (years 2019, 2020, and 2021). Method: Cross-sectional, qualitative and quantitative, ex-post-facto study. Men aged 50 to 70 with diagnosis of prostate cancer were selected, and subsequently, a data collection instrument was used to determine if there was a significant difference in the number of diagnoses, health complications, clinical outcomes, and failure in treatment adherence. Data analysis was conducted using Pearson's chi-squared test and post hoc analysis with p-value correction. Results: It was observed that the pandemic significantly affected the number of consultations, especially in 2020, but there was no detriment regarding other variables. Conclusion: No failure in treatment adherence was found for these patients, which contributed to many positive outcomes in the course of the disease.
Key words: COVID-19; Prostatic Neoplasms/diagnosis; Neoadjuvant Therapy; Antineoplastic Protocols; Cancer Care Facilities.
RESUMEN
Introducción: Es incuestionable el impacto que la pandemia de COVID-19 ha tenido sobre las más diversas áreas de la salud, sin embargo, aún se conoce poco, en cifras, el efecto que la enfermedad y el aislamiento causaron en los pacientes oncológicos. Objetivo: Analizar el impacto de la pandemia en el diagnóstico y tratamiento del cáncer de próstata en hospitales especializados en el Norte y Noroeste de Paraná, comparando los períodos pre pandémico y pandémico (años 2019, 2020 y 2021). Método: Estudio transversal, cuali y cuantitativo, de carácter ex post facto. Se seleccionaron hombres de 50 a 70 años con diagnóstico de cáncer de próstata y, posteriormente, se utilizó un instrumento de recolección de datos para determinar si hubo una diferencia significativa en el número de diagnósticos, agravamientos de salud, desenlaces clínicos y fallo en la adhesión al tratamiento. Para el análisis de datos se utilizaron la prueba ji al cuadrado de Pearson y el análisis post hoc con corrección en el valor p. Resultados: Se observó que la pandemia afectó de manera significativa el número de consultas, especialmente en 2020, sin embargo, en relación con otras variables, no hubo perjuicio. Conclusión: No hubo fallo en la adhesión al tratamiento de estos pacientes, lo que contribuyó a que muchos tuvieran desenlaces positivos en relación con el curso de la neoplasia.
Palabras clave: COVID-19; Neoplasias de la Próstata/diagnóstico; Terapia Neoadyuvante; Protocolos Antineoplásicos; Instituciones Oncológicas.
INTRODUÇÃO
O câncer é considerado um dos maiores problemas de saúde pública no mundo por afetar milhões de pessoas, estando entre as principais causas de morte em diversos países. Os números de incidência e mortalidade vêm aumentando a cada ano, sendo responsável por três a cada dez mortes prematuras. No ano de 2022, houve aproximadamente 20 milhões de novos casos de câncer no mundo, seguidos por 9,7 milhões de mortes pela mesma doença, sendo o câncer de próstata a quinta principal causa de morte entre os homens em 20221.
Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA)2, para cada ano do triênio 2023-2025, ocorrerão 704 mil novos casos de câncer no Brasil. Excluindo-se o câncer de pele não melanoma, os cânceres de mama feminina e próstata serão responsáveis por aproximadamente 15% dos novos casos cada um, seguidos do câncer de cólon e reto (9,4%). Ainda, quando analisada a distribuição de incidência por região geográfica, observa-se que 48,4% dos novos casos concentram-se na Região Sudeste do país, seguido por 22,8% no Nordeste e 17,1% no Sul.
No sexo masculino, os tipos mais prevalentes de câncer (com exceção do câncer de pele não melanoma) são o da próstata (30% dos casos), cólon e reto (9,2%), traqueia, brônquios e pulmão (7,5%) e estômago (5,6%)2. Ademais, quando se trata de neoplasias malignas, o prognóstico pode ser bem variado e é dependente de múltiplos fatores, tais como: o tipo da neoplasia, sua localização, o estádio da doença, presença ou não de metástase, entre outros aspectos3. No câncer de próstata, o mais incidente entre os homens, a probabilidade de sobrevida é de 87,7% em cinco anos, sendo que os fatores idade avançada e presença de metástase, reduzem essa perspectiva4. Esses dados mostram que o diagnóstico precoce e o início rápido de tratamento são fatores determinantes para um bom prognóstico.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) e o INCA5, o principal método de investigação do câncer de próstata é a realização do toque retal e da dosagem de PSA, tendo ainda este último um papel importante na avaliação do prognóstico e recorrência desse tipo de neoplasia. O diagnóstico é confirmado mediante biópsia e, posteriormente, o tumor recebe uma classificação de estadiamento, pela escala de Gleason, que determina o tratamento mais adequado e o prognóstico do paciente, sendo a abordagem de conduta para o enfrentamento da doença totalmente individualizada5.
A pandemia pelo coronavírus foi decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no dia 11 de março de 2020, sendo um dos primeiros casos da doença no Paraná confirmado na Região Noroeste do Estado, um dia após o decreto6. Logo após a confirmação dos casos, já foram tomadas as primeiras medidas de isolamento, além do início da preparação dos hospitais para enfrentar a situação7. Ainda, segundo a base de dados do Projeto Brasil.io, março de 2021 foi o mês com o maior número de óbitos por covid-19 em todo o Paraná8.
É sabido que pacientes sob tratamento de câncer como a quimioterapia e radioterapia estão imunossuprimidos e, por isso, são mais suscetíveis a infecções. Com a pandemia, ficou comprovado que pacientes oncológicos, sob tratamento ou não da doença, estão mais propensos a se infectar com SARS-CoV-2 e ainda possuem riscos maiores de terem complicações decorrentes do vírus9. Com isso, hospitais e centros de tratamento oncológico tiveram dificuldades em estabelecer protocolos que minimizassem o risco de pegar a doença e, ainda assim, manter um acompanhamento e tratamento eficazes10.
Em um estudo descritivo desenvolvido por Ribeiro et al.11, utilizando bases de dados do Sistema Único de Saúde (SUS), observou-se que no Brasil entre 2019 e 2020 houve uma redução nos procedimentos de rastreamento (45%), de diagnóstico (35%) e tratamento de câncer (queda de cerca de 15% nas cirurgias oncológicas). Nota-se que o rastreamento e o diagnóstico do câncer foram os procedimentos mais afetados, evidenciando a principal lacuna deixada pela pandemia.
Quando se trata especificamente do câncer de próstata, dados do Ministério da Saúde12 apontam que, em uma comparação entre 2019 e 2020, o número de consultas urológicas no SUS caiu 33,5%. Além disso, a coleta de antígeno prostático específico (PSA) e de biópsia de próstata reduziram 27% e 21%, respectivamente. O número de cirurgias para retirada do câncer de próstata também caiu de 2019 para 2020, diminuindo em 21,5%12.
Em um estudo feito na Inglaterra13, analisou-se o impacto do adiamento das cirurgias oncológicas nas taxas de sobrevida dos mais variados tipos de câncer e concluiu-se que, nos casos de cânceres mais agressivos, até os pequenos atrasos (três meses) têm um impacto significante na taxa de sobrevida. Para os cânceres de prognóstico favorável, um atraso de seis meses resultaria em um número significativo de mortes, uma vez que muitas dessas neoplasias são comuns. Esses atrasos também resultam em tumores mais avançados, o que significa que o tratamento, seja cirúrgico ou quimioterápico, acaba sendo menos eficaz e mais caro.
Assim, é evidente que o sistema de saúde brasileiro possui inúmeros desafios pela frente e, por isso, uma das medidas a serem tomadas é identificar o perfil dos homens que tiveram agravos de saúde durante a pandemia pela falta de tratamento oncológico. Além disso, é importante reconhecer aqueles que deixaram de realizar os exames de rastreio, tendo assim um possível diagnóstico tardio e, por consequência, maiores chances de desfechos ruins.
Tendo em vista o que foi discutido, o objetivo deste estudo foi analisar quantitativa e qualitativamente o impacto da covid-19 nos tratamentos do câncer de próstata em hospitais especializados do Norte e Noroeste paranaense, comparando os períodos pré-pandêmico e pandêmico, além de identificar se houve diferença significativa no número de diagnósticos, falha na adesão ao tratamento, agravos de saúde e óbitos.
MÉTODO
Estudo do tipo transversal quantitativo e qualitativo, de caráter ex-post-facto. O projeto de pesquisa foi enviado a dois hospitais de referência das Regiões Norte e Noroeste paranaense, que tratam de doenças oncológicas. O andamento foi dividido em duas fases, sendo a primeira constituída de uma seleção inicial de pacientes com diagnóstico de neoplasia maligna de próstata. Após essa fase, foi empregado a dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Ficou a critério do hospital e de seu Comitê de Ética definir as datas e a forma de coletar os dados, a fim de não atrapalhar o funcionamento do estabelecimento. O instrumento de coleta de dados foi adaptado do estudo de Araújo et al.14 e a estratégia PECO foi utilizada para a sistematização da pesquisa.
Os dados coletados correspondem aos períodos de março a maio dos anos de 2019 (pré-pandemia), 2020 e 2021 (pandemia ativa) e foram recolhidas informações, de acordo com registros médicos, quanto a identificação do paciente, data da primeira consulta, início do tratamento e tipo de intervenções adotadas para tal, evolução do quadro clínico (se houve algum tipo de agravo durante o período analisado e desfecho) e número de consultas de retorno. Foi considerado impacto se, durante a pandemia, houve adiamento de consultas, se pacientes abandonaram ou adiaram o tratamento, contraíram a covid-19 ou faleceram por causa da doença. Os critérios de inclusão da amostra foram: homens com diagnóstico de câncer de próstata, na faixa etária de 50 a 70 anos, de todas as etnias e com qualquer grau de escolaridade. Não houve critérios de exclusão.
Esses dados foram compilados em uma planilha no Excel e, posteriormente, as variáveis categóricas foram descritas com frequência absoluta e relativa, sendo depois analisadas quanto à associação com os anos 2019, 2020 e 2021 por meio do teste qui-quadrado de Pearson e análise post hoc com correção no valor de p segundo Bonferroni15. A variável idade foi descrita por meio de medidas de tendência central e de dispersão, sendo a mediana dessa variável comparada, entre os hospitais, por meio do teste de Kruskal Wallis e a normalidade analisada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. As análises foram conduzidas pela plataforma de software R16.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Cesumar, sob o número de parecer 6.425.089 (CAAE: 74632823.1.0000.5539). As pesquisadoras coletaram os dados da pesquisa por meio da investigação de prontuários médicos, conforme as recomendações das diretrizes éticas relacionadas aos estudos que envolvem seres humanos de acordo com a Resolução 466/201217 do Conselho Nacional de Saúde.
Segundo a análise de dados, ao traçar um perfil dos pacientes estudados, é possível observar que a idade dos pacientes apresenta as mesmas tendências, independentemente do ano ou do hospital, variando entre 50 e 71 anos, com mediana em torno de 64 anos (Tabela 1). O valor de p do teste de Kolmogorov-Smirnov da variável idade para os hospitais 1 e 2 são < 0,001 e < 0,055, respectivamente. Dessa forma, rejeita-se a hipótese nula de que a variável idade dos pacientes do hospital 1 segue uma distribuição normal. A partir do teste de Kruskal Wallis (p = 0,0185), rejeita-se a hipótese de que as medidas são diferentes considerando-se um nível de significância de 5%.
Tabela 1. Medidas de tendência central e de dispersão das idades dos pacientes
Variável |
Número de observações |
Mínimo |
25% |
Média |
IC da média |
Mediana |
75% |
Máximo |
Desvio-padrão |
Idades em 2019 - Hospital 1 |
162 |
50 |
60 |
62,8 |
[61,9, 63,7] |
62 |
68,7 |
70 |
5,8 |
Idades em 2020 - Hospital 1 |
140 |
50 |
60 |
62,9 |
[62, 63,9] |
63 |
69 |
70 |
5,9 |
Idades em 2021- Hospital 1 |
161 |
50 |
61 |
62,7 |
[61,9, 63,5] |
63 |
65 |
71 |
5,3 |
Idades em 2019 - Hospital 2 |
23 |
56 |
63,5 |
64,9 |
[63,3, 66,5] |
66 |
68 |
69 |
3,7 |
Idades em 2020 - Hospital 2 |
28 |
55 |
61,5 |
64,5 |
[62,7, 66,3] |
65 |
68,2 |
70 |
4,7 |
Idades em 2021 - Hospital 2 |
45 |
52 |
60 |
64,2 |
[62,6, 65,7] |
66 |
69 |
70 |
5,2 |
Legenda: IC = intervalo de confiança.
Ainda, a maioria deles possuía uma neoplasia de risco intermediário (baseado na escala de Gleason) e câncer no estádio II, seguindo a classificação TNM18. Em termos percentuais, destaca-se uma crescente de casos no estádio II partindo de 4,3% em 2019, passando para 25% em 2020 e atingindo 35,5% em 2021.
Sob um ponto de vista menos detalhado, entre as variáveis internação, agravos e desfecho nos anos de 2019, 2020 e 2021, houve pouca diferença entre as proporções, destacando-se o baixo índice de internações em todos os anos, como mostram as Tabelas 2 e 3. Além disso, essas internações, na grande maioria dos casos, estavam relacionadas a procedimentos de biópsia ou prostatectomia, não tendo nenhum relato de internação por covid-19 no período analisado.
Tabela 2. Frequência das variáveis nos anos 2019, 2020 e 2021 no hospital 1
Variáveis |
2019 |
2020 |
2021 |
p |
Internação |
|
|
|
0,504 |
Não |
133 (82,1%) |
111 (79,2%) |
136 (84,4%) |
|
Sim |
29 (17,9%) |
29 (20,7%) |
25 (15,5%) |
|
Agravos |
|
|
|
0,530 |
Metástase |
13 (8%) |
10 (7,1%) |
8 (4,9%) |
|
Nenhum |
149 (91,9%) |
130 (92,8%) |
153 (95%) |
|
Desfecho |
|
|
|
0,159 |
Abandono de acompanhamento |
28 (17,2%) |
11 (7,8%) |
10 (6,2%) |
|
Abandono de tratamento |
2 (1,2%) |
1 (0,7%) |
1 (0,6%) |
|
Segue em acompanhamento |
68 (41,9%) |
64 (45,7%) |
82 (50,9%) |
|
Alta |
9 (5,5%) |
7 (5%) |
6 (3,7%) |
|
Cuidados paliativos |
4 (2,4%) |
4 (2,8%) |
5 (3,1%) |
|
Desconhecido |
30 (18,5%) |
25 (17,8%) |
22 (13,6%) |
|
Óbito |
2 (1,2%) |
3 (2,1%) |
0 (0%) |
|
Segue em tratamento |
14 (8,6%) |
20 (14,2%) |
26 (16,1%) |
|
Tratamento interrompido |
5 (3%) |
4 (2,8%) |
8 (4,9%) |
|
Estádio |
|
|
|
0,853 |
Desconhecido |
30 (18,5%) |
15 (10,7%) |
25 (15,5%) |
|
I |
5 (3%) |
5 (3,5%) |
5 (3,1%) |
|
II |
60 (37%) |
58 (41,4%) |
61 (37,8%) |
|
III |
25 (15,4%) |
23 (16,4%) |
29 (18%) |
|
IV |
42 (25,9%) |
39 (27,8%) |
41 (25,4%) |
|
Escala de Gleason |
|
|
|
0,959 |
Desconhecido |
7 (4,3%) |
5 (3,5%) |
10 (6,2%) |
|
Risco alto |
39 (24%) |
37 (26,4%) |
39 (24,2%) |
|
Risco baixo |
30 (18,5%) |
24 (17,1%) |
28 (17,3%) |
|
Risco intermediário |
86 (53%) |
74 (52,8%) |
84 (52,1%) |
|
Pandemia |
|
|
|
< 0,001 |
Houve impacto |
0 (0%) |
17 (12,1%) |
3 (1,8%) |
|
Não houve impacto |
161 (99,3%) |
123 (87,8%) |
158 (98,1%) |
|
No hospital 1 (Tabela 2), 12,1% foram afetados de alguma forma pela pandemia, seja pela infecção por covid-19 ou pela necessidade de reagendamento de consultas. Houve também uma sutil queda no abandono das consultas de acompanhamento. Não houve registros de óbitos pela doença.
Tabela 3. Frequência das variáveis nos anos 2019, 2020 e 2021 no hospital 2
Variáveis |
2019 |
2020 |
2021 |
p |
Internação |
|
|
|
0,382 |
Não |
22 (95,6%) |
28 (100%) |
42 (93,3%) |
|
Sim |
1 (4,3%) |
0 (0%) |
3 (6,6%) |
|
Agravos |
|
|
|
0,865 |
Metástase |
3 (13%) |
2 (7,1%) |
4 (8,8%) |
|
Nenhum |
20 (86,9%) |
25 (89,2%) |
40 (88,8%) |
|
Desfecho |
|
|
|
0,279 |
Abandono de tratamento |
2 (8,7%) |
2 (7,1%) |
4 (8,8%) |
|
Segue em acompanhamento |
3 (13%) |
10 (35,7%) |
20 (44,4%) |
|
Cuidados paliativos |
1 (4,3%) |
0 (0%) |
0 (0%) |
|
Óbito |
5 (21,7%) |
2 (7,1%) |
3 (6,6%) |
|
Segue em tratamento |
11 (47,8%) |
13 (46,4%) |
17 (37,7%) |
|
Tratamento interrompido |
1 (4,3%) |
1 (3,5%) |
1 (2,2%) |
|
Estádio |
|
|
|
0,058 |
Desconhecido |
2 (8,7%) |
0 (0%) |
4 (8,8%) |
|
I |
1 (4,3%) |
1 (3,5%) |
0 (0%) |
|
II |
1 (4,3%) |
7 (25%) |
16 (35,5%) |
|
III |
1 (4,3%) |
3 (10,7%) |
6 (13,3%) |
|
IV |
18 (78,2%) |
17 (60,7%) |
19 (42,2%) |
|
Escala de Gleason |
|
|
|
0,835 |
Desconhecido |
1 (4,3%) |
0 (0%) |
1 (2,2%) |
|
Risco alto |
7 (30,4%) |
5 (17,8%) |
10 (22,2%) |
|
Risco baixo |
2 (8,7%) |
2 (7,1%) |
3 (6,6%) |
|
Risco intermediário |
13 (56,5%) |
21 (75%) |
31 (68,8%) |
|
Pandemia |
|
|
|
0,443 |
Houve impacto |
0 (0%) |
2 (7,1%) |
2 (4,4%) |
|
Não houve impacto |
23 (100%) |
26 (92,8%) |
43 (95,5%) |
|
Quando aplicado o teste qui-quadrado de Pearson, concluiu-se que na realidade houve sim diferenças nas proporções de agravos, desfecho, estádio, escala de Gleason e impacto pela pandemia nos anos 2019, 2020 e 2021, em ambos os hospitais. De acordo com a Tabela 4, há diferenças significativas, ao nível de significância de 5%, entre as proporções de impactos pela pandemia.
Tabela 4. Teste qui-quadrado para análise das proporções das variáveis investigadas
Variável |
p* |
Internação |
0,595 |
Agravos |
0,705 |
Desfecho |
0,148 |
Estádio |
0,530 |
Escala de Gleason |
0,938 |
Impacto da pandemia |
0,0000013** |
(*) Teste qui-quadrado de Pearson.
(**) Ao se observar o p ≤ 0,05 na variável “Impacto da pandemia”, conclui-se que houve uma diferença significativa nas frequências comparando os anos 2019, 2020 e 2021 em ambos os hospitais.
Ao aplicar o teste qui-quadrado de Pearson envolvendo variáveis com três ou mais categorias, faz-se necessária a análise post hoc aplicando uma correção no valor de p, conforme Bonferroni16. Relações significativas após post hoc são apresentadas na Tabela 5 com os respectivos intervalos de confiança e odds ratio (razão de chances).
Tabela 5. Comparação do impacto da pandemia nos dois hospitais em 2019, 2020 e 2021
Impacto da pandemia |
p original |
p corrigido (Bonferroni) |
Odds ratio |
IC 95%* |
2019 vs. 2020 |
< 0,001 |
0,0001 |
0,0429 |
0, 0,28 |
2019 vs. 2021 |
0,269 |
0,809 |
0,2192 |
** |
2020 vs. 2021 |
0,001 |
0,003 |
5,1053 |
1,79, 17,9 |
(*) Intervalo de confiança.
(**) Calculado apenas para fatores significativos.
Nota: Foi considerado impacto se, em decorrência da pandemia, consultas e tratamentos foram adiados ou cancelados e se pacientes contraíram ou foram a óbito por causa da covid-19.
Apesar de o número de pessoas afetadas pela pandemia não aparentar ser tão expressivo dado o número de pacientes atendidos, de acordo com a Tabela 5 há sim diferenças significativas entre 2019 e 2020 e principalmente entre 2020 e 2021, sendo que os pacientes atendidos em 2020 foram cinco vezes mais afetados. No entanto, cabe aqui ressaltar que não houve diferenças significativas nos agravos e desfechos, ou seja, a pandemia não foi fator predominante para o sucesso do tratamento.
DISCUSSÃO
Nos hospitais analisados, houve pouca interferência da pandemia no tratamento e acompanhamento do quadro clínico dos pacientes, sendo as maiores taxas de reagendamentos de consultas e terapias em 2020, no início da pandemia. Os dados encontrados neste estudo diferem dos dados encontrados por Gouveia et al.19, que constataram uma redução nos números de radioterapia e prostatectomia radical feitos em pacientes com câncer de próstata no Brasil, na época da pandemia.
Não foi possível estabelecer uma análise em relação ao número de diagnósticos postergados, uma vez que os dados de primeira consulta são variados e não se encaixaram na análise numérica. Por outro lado, estudos que analisaram o atraso de biópsias e cirurgias radicais em países europeus concluíram que não houve associação destes com um mau prognóstico para o paciente20,21. Já em um estudo parecido feito na Inglaterra22, percebeu-se que o déficit comprovado em diagnósticos de câncer de próstata levou muitos homens a descobrirem sua doença em um estádio mais avançado, com metástases.
Como pôde-se observar, a pandemia impactou negativamente os cuidados com pacientes oncológicos em todo o mundo, porém, percebe-se que o efeito não foi o mesmo em todo o Brasil, nem mesmo em todos os países. Assim, é importante que cada centro de saúde busque saber o impacto que a covid-19 trouxe para seus pacientes e, a partir disso, trace um plano de ação para minimizar os possíveis danos.
CONCLUSÃO
Diante dos resultados, é possível inferir que apesar de a pandemia pelo SARS-CoV-2 ter reduzido a quantidade de consultas nos hospitais estudados, principalmente em 2020, felizmente não agravou o curso da neoplasia nos pacientes estudados, uma vez que estes continuaram com os tratamentos propostos e, mesmo aqueles que contraíram covid-19, não tiveram complicações ou óbitos.
Em virtude de inconsistências nos prontuários quanto às datas de primeira consulta e confirmação de diagnósticos, não foi possível estabelecer uma comparação entre os anos de 2019, 2020 e 2021 para identificar se, em decorrência da pandemia, houve redução no número de diagnósticos feitos.
Por fim, é importante ressaltar que o acompanhamento e a manutenção do cuidado a esses homens foram fundamentais para que a doença não avançasse para estádios piores, reforçando a ideia de que, mesmo em situações de calamidade na saúde mundial, o paciente com câncer não deve ser negligenciado.
CONTRIBUIÇÕES
Todas as autoras contribuíram na concepção e no planejamento do estudo; na obtenção, análise e interpretação dos dados; assim como na redação e revisão crítica, e aprovaram a versão final a ser publicada.
DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES
Nada a declarar.
FONTES DE FINANCIAMENTO
Universidade Cesumar de Maringá por meio do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC).
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Aprovado em 25/7/2024
Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777
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