Conhecimento de Acadêmicos de Odontologia sobre os Riscos do Cigarro Eletrônico para a Saúde Bucal
Knowledge of Dentistry Students about the Risks of Electronic Cigarettes for Oral Health
Conocimiento de Estudiantes de Odontología sobre los Riesgos del Cigarrillo Electrónico para la Salud Bucal
https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2024v70n2.4703
Erika Pires dos Santos1; Mateus Cardoso Oliveira2; Cezar Augusto Casotti3
1Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), Faculdade de Odontologia. Jequié (BA), Brasil. E-mail: 201820245@uesb.edu.br. Orcid iD: https://orcid.org/%200009-0007-9997-3134
2,3Uesb, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem e Saúde. Jequié (BA), Brasil. E-mails: mateuscaroliver@gmail.com; cacasotti@uesb.edu.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1128-3427; Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-6636-8009
Endereço para correspondência: Mateus Cardoso Oliveira. Rua Olavo Ramos, 1603 – Vitória da Conquista (BA), Brasil. CEP 45002-140. E-mail: mateuscaroliver@gmail.com
RESUMO
Introdução: O cigarro eletrônico (CE) surgiu como alternativa para reduzir o consumo do cigarro convencional. Objetivo: Analisar o conhecimento de acadêmicos de odontologia sobre os riscos do uso do CE à saúde bucal. Método: Estudo epidemiológico transversal de caráter descritivo-exploratório. Um questionário estruturado foi aplicado aos discentes matriculados do primeiro ao décimo semestre, do curso de odontologia, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Jequié-BA. Os dados foram tabulados e analisados no Excel e foram obtidas as frequências absolutas e relativas. Resultados: Dos 196 alunos matriculados, 160 (81,6%) participaram do estudo, com média de idade de 23,26 ± 4,42 anos e 157 (80,1%) já ouviram falar do CE. Entre os discentes, 29 (14,8%) experimentaram cigarro convencional e 58 (29,6%) CE, 26,5% informaram baixo conhecimento do CE e 65,6%, conhecimento intermediário. Conclusão: Na população avaliada, o nível de conhecimento acerca dos CE é insuficiente, foi obtido de forma não científica, e o tema foi pouco abordado pelas disciplinas cursadas.
Palavras-chave: Sistemas Eletrônicos de Liberação de Nicotina; Vaping; Estudos Transversais/estatística & dados numéricos; Inquéritos de Saúde Bucal; Estudantes de Odontologia/estatística & dados numéricos.
ABSTRACT
Introduction: The electronic cigarette (EC) has emerged as an alternative to reduce conventional cigarette smoking. Objective: To analyze the knowledge dentistry students have about the risks of EC use on oral health. Method: Cross-sectional, descriptive-exploratory epidemiological study. A structured questionnaire was administered to students enrolled from the first to the tenth semester in the dentistry course at the “Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia”, Jequié-BA campus. The data were tabulated and analyzed in Excel, and absolute and relative frequencies have been calculated. Results: Of the 196 students enrolled, 160 (81.6%) joined the study, with a mean age of 23.26 ± 4.42 years, and 157 (80.1%) were aware of EC. Among the students, 29 (14.8%) had tried conventional cigarettes and 58 (29.6%), EC. 26.5% assessed their knowledge of EC as low and 65.6% as intermediate. Conclusion: The level of knowledge the population investigated has on EC is insufficient, collected non-scientifically, and the topic was poorly addressed in the courses taken.
Key words: Sistemas Electrónicos de Liberación de Nicotina; Vaping; Cross-Sectional Studies/statistics & numerical data; Dental Health Surveys; Students, Dental/statistics & numerical data.
RESUMEN
Introducción: El cigarrillo electrónico (CE) ha surgido como una alternativa para reducir el consumo de cigarrillos convencionales. Objetivo: Analizar el conocimiento de estudiantes de odontología sobre los riesgos del uso del CE para la salud bucal. Método: Estudio epidemiológico transversal de carácter descriptivo-exploratorio. Se administró un cuestionario estructurado a estudiantes matriculados desde el primer hasta el décimo semestre en el curso de odontología en la Universidad Estatal del Sudoeste de Bahía, campus de Jequié-BA. Los datos se tabularon y analizaron en Excel, obteniéndose frecuencias absolutas y relativas. Resultados: De 196 estudiantes matriculados, 160 (81,6%) participaron en el estudio, con una edad media de 23,26 ±4,42 años, y 157 (80,1%) habían oído hablar del CE. Entre los estudiantes, 29 (14,8%) habían probado cigarrillos convencionales y 58 (29,6%) CE. El 26,5% evaluó su conocimiento sobre el CE como bajo y el 65,6% como intermedio. Conclusión: En la población evaluada, el nivel de conocimiento sobre los CE es insuficiente, obtenido de manera no científica, y el tema fue poco abordado en las asignaturas cursadas.
Palabras clave: Dispositifs électroniques d'administration de nicotine; Vapeo; Estudios Transversales/estadística & datos numéricos; Encuestas de Salud Bucal; Estudiantes de Odontología/estadística & datos numéricos.
INTRODUÇÃO
O consumo de tabaco é fator causador evitável de várias doenças, a exemplo das cardiovasculares, respiratórias e alguns tipos de câncer1. Entre as mais de 7 mil toxinas presentes no tabaco, pelo menos 70 são cancerígenas e ocasionam mais de 7 milhões de mortes anualmente2. É fator de risco para a saúde bucal, pois contribui para o surgimento de cânceres de boca, doenças periodontais, halitoses, alterações nas mucosas, e pigmentação dos dentes3.
O tabagismo é uma doença crônica associada à dependência à nicotina e, por ser um hábito inserido muito precocemente na vida dos usuários, entende-se o seu processo dependente ao longo do tempo1. Recentemente, um dispositivo eletrônico para consumo de tabaco surgiu no mercado, inicialmente percebido como uma alternativa menos prejudicial aos cigarros convencionais, visando reduzir o consumo de tabaco4. Esses dispositivos operam aquecendo uma solução líquida que contém nicotina, aromatizantes e outros compostos químicos, resultando na criação de um aerossol que os utilizadores inalam5. Os sais de nicotina, componentes-chave nos líquidos do cigarro eletrônico (CE), são formulados com ácidos orgânicos como ácido sórbico, ácido glicólico e ácido ascórbico, os quais aumentam o potencial de dependência dos usuários6.
A indústria do tabaco tem um importante papel em promover tanto o cigarro tradicional quanto o eletrônico, visando atrair jovens e manter o vício7. Estudos mostram que os fabricantes propagam e minimizam os danos do CE e encorajam os jovens a experimentarem, e isto está ligado ao aumento do uso desses produtos entre jovens e adultos jovens8.
Um número considerável de estudantes dos ensinos fundamental e médio já experimentou CE, convencionais e charutos9. No Brasil, esse dispositivo é conhecido como vaper ou CE, é comercializado em formatos de canetas e pen drives, e vem se tornando um modismo entre adolescentes e jovens10. Embora os indicadores relacionados à experimentação de cigarros tenham permanecido estáveis, houve um aumento notável na experimentação de narguilé, CE e outros produtos à base de tabaco entre estudantes brasileiros, destacando a necessidade de novas medidas regulatórias11,12.
O CE apresenta riscos à saúde em virtude dos compostos tóxicos e metais pesados em seus líquidos e aerossóis que podem causar danos por inalação, exposição dérmica e ingestão oral13. O uso crônico pode levar à dependência, dispneia, dor no peito e ao aumento dos riscos de hipoxemia14 e riscos cardiovasculares, como aterosclerose, hipertensão, arritmias, infarto do miocárdio e insuficiência cardíaca15, aumento do tônus simpático, rigidez vascular, disfunção endotelial16, surtos de lesões pulmonares e altos níveis de substâncias cancerígenas e tóxicas17, além do risco de lesões graves causando queimaduras, lacerações e hematomas na face do usuário18.
A exposição passiva aos aerossóis do CE pode afetar a saúde de diversas maneiras. Experimentos revelam que 30 minutos de exposição passiva podem causam alterações imediatas na mecânica respiratória e nos biomarcadores exalados em razão da deposição e evaporação no pulmão humano19.
Apesar das políticas públicas de controle do tabagismo implantadas no Brasil nas últimas três décadas, o uso de CE aumentou entre os jovens20, por conta da disseminação de informações que sugerem que são menos prejudiciais à saúde do que os tradicionais21, além de práticas ilegais na sua comercialização, o que contribui para a complexidade do seu controle22. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária23 (Anvisa) proibiu a comercialização, importação, propagandas e marketings de CE, por falta de evidências científicas que comprovem a segurança do uso e a eficácia no combate ao tabagismo11,12.
Assim, considerando os efeitos maléficos do CE para a saúde geral e bucal, este estudo objetiva analisar o conhecimento de acadêmicos de odontologia sobre os riscos do uso do CE à saúde bucal.
MÉTODO
Estudo epidemiológico, de corte transversal, descritivo-exploratório, realizado no mês de agosto de 2023, com discentes do curso de graduação em odontologia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), campus de Jequié, Bahia.
A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Uesb sob o número de parecer 6025176 (CAAE: 68765223.4.0000.0055), com base na Resolução n.º 466/201224 do Conselho Nacional de Saúde.
Os dados foram obtidos por meio de questionário estruturado, proposto Silva25 e adaptado pelos pesquisadores, o qual continha 26 questões (sociodemográficas, de experimentação e consumo de tabaco e CE, e conhecimento dos discentes acerca do CE).
Inicialmente, a pesquisadora entrou em contato com o representante discente de cada uma das dez turmas do curso de odontologia da Uesb para identificar os horários das aulas e as salas nas quais estariam presentes. Assim, foi possível identificar os melhores dia e horário para aplicar o questionário. Foi solicitada aos professores que estavam ministrando a aula uma autorização para adentrar a sala e apresentar os objetivos do estudo. A seguir, os discentes que aceitaram participar do estudo permaneceram na sala de aula e receberam uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após obter o consentimento, foi-lhes entregue uma cópia do questionário, o qual foi respondido, na sala de aula, sem controle de tempo prévio.
Participaram do estudo alunos matriculados no curso de odontologia da Uesb com idade ≥18 anos que, no mês de agosto de 2023, estavam matriculados em cada um dos dez semestres letivos do curso. Foram excluídos discentes não localizados na sala de aula após três visitas e os que não concordaram participar do estudo. À medida que os discentes terminavam de responder aos questionários, saiam da sala e deixavam a cópia respondida do instrumento e uma cópia do TCLE com o pesquisador.
De posse dos questionários respondidos, os dados foram tabulados e analisados em uma planilha do software Excel, e foram obtidas as frequências absolutas, percentuais, medidas de tendência central e de dispersão.
RESULTADOS
Dos 196 acadêmicos matriculados no curso de odontologia na Uesb, 160 (81,6%) aceitaram participar da pesquisa, 28 (14,3%) foram excluídos por não terem sido localizados na sala de aula após três tentativas e oito (4,1%) por apresentarem idade inferior a 18 anos.
Dos entrevistados, 117 (73,1%) eram do sexo feminino, a idade dos participantes variou de 18 a 77 anos, sendo a média de 23,26 ± 4,42 anos.
As prevalências da experimentação de CE e cigarro convencional foram respectivamente 36,2% e 18,1%, e do consumo de CE 3,1%. Verificou-se ainda que 15% dos entrevistados experimentariam o CE caso um amigo lhes oferecesse.
O conhecimento dos discentes do curso de odontologia da Uesb em relação ao CE está descrito na Tabela 1.
Tabela 1. Conhecimento dos discentes de odontologia da Uesb sobre o cigarro eletrônico e sua abordagem na matriz curricular. Jequié-BA, 2023
Variáveis |
Categorias |
n |
% |
O CE é mais prejudicial à saúde do que cigarro convencional?
|
Mais prejudicial |
89 |
55,6 |
Menos prejudicial |
9 |
5,6 |
|
Igualmente prejudicial |
53 |
33,1 |
|
Não oferece riscos |
- |
- |
|
Não sei |
9 |
5,6 |
|
No Brasil é permitida a venda de CE |
Sim |
48 |
30 |
Não |
68 |
42,5 |
|
Não sei |
43 |
26,8 |
|
O CE auxilia na cessação do consumo do cigarro convencional |
Sim |
24 |
15 |
Não |
62 |
38,75 |
|
Não sei |
74 |
46,25 |
|
O aerossol do CE traz danos à saúde do fumante passivo |
Sim |
101 |
63,1 |
Não |
4 |
2,5 |
|
Não sei |
55 |
34,3 |
|
O CE contém nicotina |
Sim |
97 |
60,6 |
Não |
21 |
13,1 |
|
Não sei |
41 |
25,6 |
|
O teor de nicotina no CE em relação ao cigarro convencional é |
Maior |
46 |
28,75 |
Igual |
7 |
4,3 |
|
Menor |
9 |
5,6 |
|
Não sei |
93 |
58,1 |
|
O CE influencia no uso de cigarro convencional |
Sim |
99 |
61,8 |
Não |
8 |
5 |
|
Não sei |
51 |
31,8 |
|
O CE é mais aceito socialmente |
Sim |
138 |
86,25 |
Não |
7 |
4,3 |
|
Não sei |
15 |
9,3 |
|
Você conhece os motivos que levam uma pessoa a usar CE |
Sim |
59 |
36,8 |
Não |
101 |
63,1 |
|
O CE oferece riscos à saúde geral |
Sim |
154 |
96,25 |
Não |
1 |
0,6 |
|
Não sei |
5 |
3,1 |
|
O CE aumento o risco de câncer |
Sim |
132 |
82,5 |
Não sei |
28 |
17,5 |
|
É importante para o dentista adquirir conhecimento sobre CE |
Sim |
156 |
97,5 |
Não |
2 |
1,25 |
|
Não sei |
2 |
1,25 |
|
Alguma disciplina abordou o tema CE? |
Sim |
17 |
10,6 |
Não |
137 |
85,6 |
|
Não sei |
5 |
3,1 |
Conforme apresentado na Tabela 1, os discentes do curso de odontologia da Uesb relataram que o CE é mais prejudicial à saúde do que o cigarro convencional e que contém nicotina, que ele influência no uso de cigarro convencional, que é mais aceito socialmente que oferece riscos à saúde geral e que aumenta o risco de câncer. Entretanto, desconhecem que, no Brasil, a sua comercialização é proibida pela Anvisa, que não auxilia na cessação do consumo de cigarro convencional, que o aerossol exalado causa danos à saúde do fumante passivo, e sobre o teor de nicotina.
Os discentes relataram que o dentista necessita de mais conhecimento sobre o CE e que o tema precisa ser mais bem abordado na matriz curricular das disciplinas do curso.
A Tabela 2 mostra o conhecimento dos discentes do curso de odontologia da Uesb em relação ao CE.
Tabela 2. Conhecimento dos discentes e meios utilizados na obtenção de informação acerca do CE. Jequié-BA, 2023
Variáveis |
Categorias |
n |
% |
Seu nível de conhecimento sobre CE é? |
Baixo |
41 |
25,6 |
|
Intermediário |
105 |
65,6 |
|
Avançado |
12 |
7,5 |
|
Desconhece |
2 |
1,25 |
Onde obteve a informação sobre CE? |
Literatura científica |
36 |
22,5 |
|
Mídias |
64 |
40 |
|
Opinião de profissionais |
38 |
23,7 |
|
Internet |
85 |
53,1 |
|
Desconhece |
6 |
3,7 |
|
Outros |
6 |
3,7 |
Conforme observado na Tabela 2, o conhecimento dos discentes do curso de odontologia da Uesb sobre o uso do CE pode ser considerado como intermediário, tendo em vista que houve predominância da Internet e mídias como fontes de informação. Tais achados destacam a tendência dos alunos em buscar conhecimento em canais talvez menos confiáveis ou não científicos (Tabela 2).
DISCUSSÃO
A presente pesquisa investigou o conhecimento dos estudantes do curso de odontologia de uma universidade pública no interior da Bahia sobre os CE que foram inicialmente apresentados como uma possível alternativa menos prejudicial ao tabagismo tradicional, em razão da crença de serem menos nocivos à saúde4. Entretanto, a quantidade de nicotina presente nesses dispositivos pode, em alguns casos, ser igual ou superior à do cigarro convencional26.
Neste estudo, a prevalência de experimentação do CE entre os discentes foi consideravelmente alta, quase o dobro da taxa de experimentação do cigarro convencional. Possivelmente, esses resultados podem estar relacionados à curiosidade ou à menor percepção dos jovens, que são maioria na população avaliada, em relação aos riscos associados ao uso do CE. Esse grupo etário veem os CE como menos nocivos e são mais propensos a usá-los27, e mostram mais interesse em sistemas eletrônicos de nicotina, sugerindo um possível efeito de porta de entrada para o tabagismo, embora as evidências de uma conexão direta sejam limitadas28.
Um pequeno percentual dos discentes da Uesb (3,1%) faz uso de CE, sugerindo que, embora a experimentação seja elevada, não levou ao uso regular. Outros estudos internacionais identificaram prevalência maior do uso do CE. Prevalência semelhante foi observada na Tailândia onde, entre 1.968 estudantes de odontologia, 4,2% eram usuários atuais de CE29. Esses achados sugerem que, em algumas regiões, o uso de CE entre estudantes de odontologia é relativamente raro, talvez por causa de uma maior conscientização sobre os riscos à saúde associados ao uso desses produtos.
Por outro lado, uma maior prevalência de consumo de CE foi observada ao avaliar 400 estudantes de odontologia na Região de Riade, Arábia Saudita, onde 26% haviam usado CE e, destes, 21% continuavam utilizando30. O maior uso de CE nessa população pode refletir diferenças culturais, sociais ou econômicas que influenciam o comportamento dos estudantes em relação aos CE.
Pesquisas indicam que padrões de consumo de CE variam por origem socioeconômica e aumentam com o tempo, enquanto exposição a informações e a ambientes sociais afetam as intenções de uso31. Além disso, gênero, raça, orientação sexual e status socioeconômico moldam a percepção dos riscos à saúde, destacando a necessidade de intervenções adaptadas a contextos específicos para prevenir e reduzir o uso de CE entre os jovens32.
Interessante notar que, entre discentes do curso de odontologia da Uesb, um percentual considerável afirmou que experimentaria o CE caso um amigo oferecesse. Isso sublinha o papel significativo da influência social no comportamento de experimentação de substâncias, especialmente em um contexto universitário onde as redes sociais são uma parte importante da vida dos estudantes. O comportamento de fumar entre adolescentes é influenciado pela companhia de amigos fumantes, pela exposição a informações sobre CE e pela presença de familiares que também fumam33. Além disso, conexões sociais com outros usuários afetam a percepção de risco e a disposição para parar de fumar34. No ambiente universitário, fatores como gênero, educação, estilo de vida e emoções também moldam o uso de cigarros convencionais e eletrônicos, com a norma social, expectativas de resultados e motivações pessoais, sendo importantes para entender o uso de sistemas eletrônicos de administração de nicotina, ressaltando a necessidade de abordagens diversificadas para reduzir esse consumo35.
Neste estudo, a prevalência de acadêmicos de odontologia com conhecimento sobre CE mostrou-se comparável à de uma pesquisa multinacional envolvendo 20 escolas de odontologia em 11 países36, onde 90,8% dos 5.697 participantes relataram conhecer36. Esse dado indica que o conhecimento sobre o assunto é extensivamente difundido entre os estudantes de odontologia em diversos países. Notavelmente, nesse estudo, a principal fonte de informação dos alunos sobre CE foi a Internet e outras mídias. As redes sociais também foram destacadas como um canal importante de informação em um estudo multinacional (26%)36. Tal achado destaca a importância das mídias digitais na disseminação de informações entre os futuros profissionais. A mídia influencia significativamente a opinião pública e as políticas governamentais, ressaltando a importância de uma cobertura mediática equilibrada para informar o público de maneira eficaz37.
Um pequeno percentual dos discentes do curso de odontologia da Uesb afirma que as disciplinas cursadas abordaram os malefícios do uso do CE. Isso sugere que a matriz curricular pode não estar cobrindo adequadamente esse assunto e evidencia a necessidade de integrar mais informações sobre CE no currículo acadêmico, dado o significativo percentual de estudantes que obtêm informações de fontes não acadêmicas. Embora as crenças e atitudes dos estudantes de odontologia sobre CE sejam aceitáveis, seu conhecimento é insatisfatório e deveria ser incorporado ao currículo odontológico36. A maioria dos alunos do último ano de odontologia não se sente preparada para aconselhar pacientes sobre o uso desses dispositivos38, evidenciando, assim, uma lacuna entre as atitudes e o conhecimento desses estudantes sobre CE e sublinhando a necessidade de integrar essa temática de forma mais efetiva nos currículos futuros39.
Verificou-se que os acadêmicos de odontologia da Uesb desconhecem que, no Brasil, a Anvisa23, no ano de 2024, proibiu a comercialização, importação, propaganda e marketing de CE. O desconhecimento sobre tal proibição revela uma lacuna no currículo de odontologia da Uesb, sugerindo a necessidade de incluir mais informações sobre políticas de saúde pública. Isso pode prejudicar a prática futura dos acadêmicos, pois entender as leis de saúde é crucial para aconselhar pacientes e garantir práticas seguras.
Apesar dos avanços nas políticas de saúde bucal, ainda há um foco limitado nos aspectos de saúde pública dentro da profissão odontológica, com uma pequena porcentagem de publicações acadêmicas abordando as políticas de saúde bucal40. Vale destacar que conhecer a legislação e as políticas de saúde pública é essencial para promover a equidade na saúde e garantir o acesso a cuidados com base em evidências científicas para todos os indivíduos ao longo da sua vida41.
Este estudo é um dos poucos a abordar esse tema no Brasil. Uma limitação a ser considerada é que alguns estudantes podem não ter se sentido confortáveis para compartilhar seus hábitos e crenças em virtude da sensibilidade do assunto na área da saúde. Embora a amostra seja representativa do curso em questão, seu tamanho é pequeno, o que sugere que futuras pesquisas devam envolver um número maior de estudantes de diferentes instituições de ensino para criar um perfil mais representativo da situação nacional.
CONCLUSÃO
Os estudantes de odontologia da Uesb têm pouco conhecimento sobre os riscos do uso de CE para a saúde bucal e geral. Esses achados evidenciam a necessidade de ampliar a discussão desse tema na matriz curricular do curso para que eles identifiquem os riscos, as políticas de uso do CE e possam desenvolver estratégias de promoção da saúde bucal, incluindo diagnóstico e tratamento de patologias associadas ao uso desses dispositivos. Isso capacitaria os futuros profissionais de saúde a oferecerem tratamentos adequados aos pacientes, promovendo uma abordagem mais segura e educativa sobre o assunto.
CONTRIBUIÇÕES
Erika Pires dos Santos contribuiu substancialmente na concepção e no planejamento do estudo; na obtenção, análise e interpretação dos dados; e na redação. Mateus Cardoso Oliveira contribuiu substancialmente na obtenção, análise e interpretação dos dados; e na redação. Cezar Augusto Casotti contribuiu substancialmente na concepção e no planejamento do estudo; na obtenção, análise e interpretação dos dados; na redação e revisão crítica. Todos os autores aprovaram a versão final a ser publicada.
DECLARAÇÃO DE CONFLITO DE INTERESSES
Nada a declarar.
FONTES DE FINANCIAMENTO
Não há.
REFERÊNCIAS
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Recebido em 7/5/2024
Aprovado em 28/5/2024
Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777
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