EDITORIAL
O Câncer como Desafio de Saúde Pública e o Instituto Nacional de Câncer promovendo a Atividade Física no Brasil como Ação de Prevenção e Controle
Cancer as a Public Health Challenge and the National Cancer Institute Promoting Physical Activity in Brazil as a Prevention and Control Action
El Cáncer como Desafío de Salud Pública y el Instituto Nacional del Cáncer Promoviendo la Actividad Física en el Brasil como Acción de Prevención y Control
https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2025v71n2.5106
Fabio Fortunato Brasil de Carvalho1; Thainá Alves Malhão2; Luciana Grucci Maya Moreira3
1-4Instituto Nacional de Câncer, Coordenação de Prevenção e Vigilância (Conprev), Área Técnica de Alimentação, Nutrição, Atividade Física e Câncer (Atanafc). Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
1E-mail: fabio.carvalho@inca.gov.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-2979-6359
2E-mail: tmalhao@inca.gov.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-5644-1089
3E-mail: luciana.maya@inca.gov.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-1454-1732
Endereço para correspondência: Fabio Fortunato Brasil de Carvalho. Rua Marquês de Pombal 125 – Centro. Rio de Janeiro (RJ), Brasil. CEP 20230-240. E-mail: fabio.carvalho@inca.gov.br
O Instituto Nacional de Câncer (INCA), órgão auxiliar do Ministério da Saúde, orienta suas ações por meio da Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC)1 e destaca o papel da atividade física no controle da doença. Essa prática está associada à prevenção de alguns tipos de câncer que estão entre os mais frequentes na população brasileira, como o de mama feminino e o de cólon (intestino grosso)2,3. Além disso, contribui para o controle de sintomas durante e após o tratamento, por exemplo, reduz a fadiga e melhora o estado psicossocial4, além de promover outros benefícios gerais à saúde. Em janeiro de 2025, o INCA reafirmou seu compromisso com a proteção da saúde da população brasileira ao lançar um posicionamento5 acerca da atividade física e com a previsão de também publicar uma cartilha sobre o tema para pacientes, cuidadores e familiares.
Com base em evidências crescentes sobre a efetividade da atividade física na prevenção e controle do câncer6-9 e considerando mais de 30 anos de oferta dessa prática no Sistema Único de Saúde (SUS)10, o Instituto tem desenvolvido estratégias para fortalecê-la nas políticas públicas de saúde.
Um dos destaques é a qualificação de profissionais para que a promoção da atividade física seja integrada ao cotidiano das unidades de saúde do SUS, contribuindo para evitar novos casos e no cuidado/tratamento de pessoas com a doença. Para isso, tem investido na oferta de oficinas virtuais de capacitação em parceria com a gestão estadual e municipal do SUS e na oferta de um curso em educação a distância (EaD). Ademais, o INCA atua na produção de estudos e materiais técnico-científicos, e posicionamentos institucionais3,4,11,12, na disseminação das informações por meio de ações de educação em saúde, comunicação, mobilização e ensino, e na participação em diferentes espaços estratégicos que discutem políticas públicas. Destaca-se que todas as ações abordam, além da promoção da atividade física, temas como a importância da alimentação saudável, do controle do peso corporal e da restrição do consumo de bebidas alcoólicas, já que a sinergia de ações de saúde é essencial.
Conforme explicitado no posicionamento institucional5, o INCA compreende a atividade física como qualquer movimento corporal humano que tanto requer a contração de músculos esqueléticos, resultando em gasto energético, quanto a consideração de espaços e contextos nos quais o movimento ocorre. Pois reconhece que pode haver uma miríade de motivações, interesses, emoções e ideias, que, por sua vez, influenciam as realizações dos movimentos. Podem ser realizadas como ginásticas, jogos, danças, esportes, lutas, entre outros. Além dos aspectos biológicos, a abordagem do INCA reconhece a relevância de fatores sociais, culturais e emocionais, sem hierarquias entre eles. A opção de dar luz a outros elementos, que não só a biologia humana, e, a partir dela, os mecanismos envolvidos na doença, parte do pressuposto de que usar, como único ou principal argumento, a redução do risco de adoecer, por exemplo, por um tipo de câncer, precisa ser superado, sem ser abandonado, mas sendo parte, e não o todo, das possibilidades de diálogo e ação. Portanto, a abordagem considera as necessidades, preferências e as possibilidades de cada pessoa ou comunidade atendida, promovendo estratégias individualizadas e coletivas que tornam a prática mais acessível e sustentável.
Ampliar a concepção, as narrativas e atitudes sobre a atividade física implica reconhecer que ela é um fenômeno complexo e multideterminado, influenciado por fatores individuais, coletivos, ambientais, culturais, econômicos e políticos que facilitam ou dificultam a prática13. Portanto, embora as escolhas pessoais sejam influenciadas por conhecimentos, atitudes e crenças, também refletem normas sociais e fatores mais amplos, como condições socioeconômicas e ambientais3. Ademais, a inatividade física bem como outros fatores de risco para o câncer e outras doenças crônicas tendem a ser mais prevalentes entre grupos mais desfavorecidos14. Portanto, recomendar a atividade física, sua dose (frequência, duração e intensidade), sem considerar a realidade das pessoas, pode reduzir a efetividade dessa medida tão importante para a saúde.
Mediante o exposto, o INCA, nas ações e nos debates relacionados à atividade física, busca dialogar com as distintas dimensões das vidas das pessoas, por julgar que, para que possam desfrutar dos seus benefícios para a saúde, em especial na prevenção e no controle do câncer, elas precisam ter acesso às atividades pelas quais têm mais afinidade e/ou se encaixam nas suas rotinas, de forma que seja factível iniciar e manter a prática15-17.
A referida perspectiva ampliada da atividade física está em sinergia com a defesa do fortalecimento das políticas públicas – no SUS e nas demais áreas relacionadas, como o Esporte e Lazer, a Educação e a Assistência Social – que facilitem o acesso à atividade física agradável, segura, saudável, equitativa e intencional, devendo ser uma prioridade social18. Assim, nas unidades de saúde do SUS e nos diferentes contextos e espaços onde a atividade física pode ser ofertada como prática de cuidado, promoção da saúde e lazer, é relevante que sejam considerados as preferências, a disponibilidade de tempo e os locais apropriados, com vistas a colocar as pessoas como elemento central no processo de construção da vida mais ativa fisicamente, e buscar medidas individuais e coletivas para identificar e superar as barreiras que dificultam ou impedem a realização da atividade física11.
Logo, o posicionamento do INCA acerca da atividade física ratifica o potencial dessa prática na prevenção e no controle do câncer no Brasil e vislumbra a relevância do debate em torno da criação da Política Nacional de Práticas Corporais e Atividades Físicas no SUS (PNPCAF)19,20 como um marco para consolidar e ampliar a atividade física como ação de promoção da saúde e de cuidado.
AGRADECIMENTOS
À Fabiana Montovanele de Melo, Maria Eduarda Leão Diogenes Melo, Camille Vitoriano Roçadas Pereira e Gabriela Vasconcellos de Barros Vianna.
REFERÊNCIAS
1. Presidência da República (BR). Lei nº 14.758, de 19 de dezembro de 2023. Institui a Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e o Programa Nacional de Navegação da Pessoa com Diagnóstico de Câncer; e altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 2023 dez 20; Edição 241; Seção 1:1-3.
2. Instituto Nacional de Câncer. Estimativa 2023: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2022. [Acesso 2024 dez 12]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/estimativa-2023-incidencia-de-cancer-no-brasil.
3. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Dieta, nutrição, atividade física e câncer: uma perspectiva global: um resumo do terceiro relatório de especialistas com uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: INCA; 2020. 140 p.
4. Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica. Recomendações de atividade física durante e após tratamento oncológico. São Paulo: SBOC; 2023. 33f.
5. Instituto Nacional de Câncer. Posicionamento acerca da atividade física [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2025. [Acesso 2025 jan 18]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/notas-tecnicas/posicionamento-do-inca-acerca-da-atividade-fisica
6. Ligebel JA, Bohlke K, May AM, et al. Exercise, diet, and weight management during cancer treatment: ASCO Guideline. J Clin Oncol. 2022;40(22):2491-507. doi: https://doi.org/10.1200/jco.22.00687
7. World Cancer Research Fund International. Diet, nutrition, physical activity and body weight for people living with and beyond breast cancer. The latest evidence, our guidance for patients, carers and health professionals, and recommendations for future research [Internet]. London: World Cancer Research Fund International; 2024. [Acesso 2024 nov 26]. Disponível em: https://www.wcrf.org/wp-content/uploads/2025/01/CUP-Global-BCS-Report.pdf
8. World Cancer Research Fund International. Diet, nutrition, physical activity and body weight for people living with and beyond colorectal cancer. The latest evidence, our guidance for patients, carers and health professionals, and recommendations for future research. London: World Cancer Research Fund International; 2024. [Acesso 2024 nov 26]. Disponível em: https://wcrf.org/wp-content/uploads/2024/10/CUP-Global-colorectal-report-0924.pdf
9. Yang L, Courneya KS, Friedenreich CM. The Physical Activity and Cancer Control (PACC) framework: update on the evidence, guidelines, and future research priorities. Br J Cancer. 2024;131(6):957-69. doi: https://doi.org/10.1038/s41416-024-02748-x
10. Vieira LA, Albuquerque SBG, Venturim FO, et al. 30 anos do serviço de orientação ao exercício em Vitória/ES: pioneirismo nas práticas corporais e atividades físicas no Sistema Único de Saúde. Movimento. 2020;26:e26086. doi: https://doi.org/10.22456/1982-8918.103142
11. Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica. Atividade física e câncer: recomendações para prevenção e controle. São Paulo: SBOC; 2022. 57 p.
12. Silva RCF, Malhão TA, Rezende LFM, et al. Current and future costs of cancer attributable to insufficient leisure-time physical activity in Brazil. PLoS One. 2023;18(7):e0287224.
13. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Departamento de Promoção da Saúde. Guia de Atividade Física para a População Brasileira. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2021. 54 p.
14. International Agency for Research on Cancer. Reducing social inequalities in cancer: evidence and priorities for research. Lyon: IARC; 2019.
15. The Lancet (Series from the Lancet journals) [Internet]. London: Elsevier. Vol 398, No 10298, 2021 [acesso 2023 ago 11]. Disponível em: https://www.thelancet.com/series/physical-activity-2021
16. Carvalho FFB, Vieira LA. The promotion of physical activity in LMICs: public health policy in Brazil. Lancet Glob Health. 2023;11(11):e1698.
17. Varela AR, Hallal PC. Does every move really count towards better health? Lancet Glob Health. 2024;12(8):e1215-16.
18. Hallal PC, Min Lee I, Sarmiento O, et al. The future of physical activity: from sick individuals to healthy populations. Inter J Epidemiol. 2024;53(5):1-4.
19. Carvalho FFB, Vieira LA. Práticas corporais e atividades físicas como política pública de saúde: desafios para avançar na atenção primária do Sistema Único de Saúde no período de 2023 a 2026. RPP. 2023;26:1-28. doi: https://doi.org/10.5216/rpp.v26.75847
20. Conselho Nacional de Saúde (BR) [Internet]. Brasília, DF: MS; [Sem data]. Criação de Política Nacional de Práticas Corporais e Atividades Físicas, 2024 ago 15. [Acesso 2024 ago 27]. Disponível em: https://www.gov.br/conselho-nacional-de-saude/pt-br/assuntos/noticias/2024/agosto/criacao-de-politica-nacional-de-praticas-corporais-e-atividades-fisicas
Recebido em 27/1/2025
Aprovado em 29/1/2025
Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777
![]()
Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições, desde que o trabalho original seja corretamente citado.