ARTIGO ORIGINAL

 

Correlaçăo entre a Força Muscular, Escala de Sintomas e Funcionalidade de Pacientes Oncológicos em Cuidados Paliativos

Correlation between Muscle Strength, Symptom Scale and Functionality of Oncology Patients in Palliative Care

Correlación entre Fuerza Muscular, Escala de Síntomas y Funcionalidad de Pacientes Oncológicos en Cuidados Paliativos

 

 

https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2025v71n3.5199

 

Jaqueline Pinheiro da Silvaą; Saul Rassy Carneiro˛; Rayssa da Silva Araújoł; Myara Cristiny Monteiro Cardoso⁴

 

1-4Universidade Federal do Pará. Belém (PA), Brasil.

1E-mail: jaqueline.pinheirosjp@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0001-9110-7724

2E-mail: saul@ufpa.br. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-6825-0239

3E-mail: araujorayssa2@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-3700-1288

4E-mail: myaracardoso@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-2456-8034

 

Endereço para correspondęncia: Jaqueline Pinheiro da Silva. Rua Augusto Corręa, 01 – Guamá. Belém (PA), Brasil. CEP 66075-110. E-mail: jaqueline.pinheirosjp@gmail.com

 

 

RESUMO

Introduçăo: A estimativa mundial estabelece que a cada ano 56,8 milhőes de pessoas necessitam de cuidados paliativos, dos quais 28,2% correspondem aos pacientes com neoplasias malignas que precisam de cuidados paliativos na vida adulta. Objetivo: Avaliar os sintomas e a funcionalidade de pacientes oncológicos em cuidados paliativos internados e correlacionar com a força muscular. Método: Estudo transversal analítico em pacientes internados, tendo sido incluídos todos os pacientes elegíveis para a pesquisa no período do estudo e avaliados quanto ŕ epidemiologia, além da aplicaçăo de tręs escalas: Edmonton Symptom Assessment System (ESAS), Palliative Performance Status (PPS) e Medida de Independęncia Funcional (MIF), e do teste de força muscular com uso do dinamômetro hidráulico. Resultados: Um total de 53% dos pacientes tinha menos de 60 anos e 66% eram mulheres. Com uma média de 96, a MIF retratou uma funcionalidade preservada com 76,19% do potencial mantido, a PPS obteve média de 54, mas a força muscular e a ESAS revelaram médias abaixo do padrăo. Houve correlaçăo entre dinamometria e ESAS em homens, dinamometria e PPS em mulheres, dinamometria e MIF em mulheres e dinamometria e ESAS em pacientes que năo realizaram quimioterapia. Conclusăo: Constatou-se que existe correlaçăo positiva entre as escalas funcionais e dinamometria para as mulheres. Além disso, os homens apresentaram maior força muscular quanto maior a sintomatologia, assim como os pacientes que năo fizeram quimioterapia.

Palavras-chave: Avaliaçăo de Sintomas; Pacientes Internados; Neoplasias; Cuidados Paliativos; Força Muscular.

 

 

ABSTRACT

Introduction: The world estimates indicate that at each year, 56.8 million individuals require palliative care, of which 28.2% are patients with malignant neoplasms who need palliative care in adulthood. Objective: To assess the symptoms and functionality of oncology inpatients receiving palliative care and correlate with muscle strength. Method: Analytical cross-sectional study with inpatients, including all eligible patients during the study period who were epidemiologically evaluated in addition to the application of three scales: ESAS (Edmonton Symptom Assessment System), PPS (Palliative Performance Status) and FIM (Functional Independence Measure) and muscle strength test using a hydraulic dynamometer. Results: 53% were under 60 years old, 66% were women. According to FIM, the mean was 96, revealing a preserved functionality of 76.19% of the potential maintained, PPS reached a mean of 54, and muscle strength and ESAS exposed a below-standard mean. There was a correlation for dynamometry and ESAS in males, dynamometry and PPS in females, dynamometry and FIM in females and dynamometry and ESAS in patients who did not undergo chemotherapy. Conclusion: It was found a positive correlation between the functional scales and dynamometry for women. In addition, men showed greater muscle strength as greater were the symptoms, like the patients who did not undergo chemotherapy.

Key words: Symptom Assessment; Inpatients; Neoplasms; Palliative Care; Muscle Strength.

 

 

RESUMEN

Introducción: La estimación global establece que cada ańo 56,8 millones de personas requieren cuidados paliativos, de los cuales el 28,2% corresponde a pacientes con neoplasias malignas que necesitan cuidados paliativos en la edad adulta. Objetivo: Evaluar los síntomas y la funcionalidad de pacientes oncológicos hospitalizados que reciben cuidados paliativos y correlacionarlos con la fuerza muscular. Método: Estudio transversal analítico en pacientes hospitalizados, incluyendo todos los pacientes elegibles para la investigación durante el período de estudio, evaluados respecto a datos epidemiológicos además de la aplicación de tres escalas: ESAS (Edmonton Symptom Assessment System), PPS (Palliative Performance Status) y MIF (Medida de Independencia Funcional) y de la prueba de fuerza muscular utilizando un dinamómetro hidráulico. Resultados: El 53% era menor de 60 ańos y el 66% eran mujeres. Con un promedio de 96, la MIF mostró una funcionalidad conservada con el 76,19% del potencial mantenido, el PPS obtuvo un promedio de 54, en cuanto a la fuerza muscular y al ​​ESAS estas expusieron un promedio por debajo del estándar. Hubo una correlación para dinamometría y ESAS en hombres, dinamometría y PPS en mujeres, dinamometría y MIF en mujeres, y dinamometría y ESAS en pacientes que no recibieron quimioterapia. Conclusión: Se observó una correlación positiva entre las escalas funcionales y la dinamometría en el grupo femenino. Además, el grupo masculino mostró mayor fuerza muscular cuanto más eran los síntomas, al igual que los pacientes que no recibieron quimioterapia.

Palabras clave: Evaluación de Síntomas; Pacientes Internos; Neoplasias; Cuidados Paliativos; Fuerza Muscular.

 

 

INTRODUÇĂO

As neoplasias malignas săo caracterizadas pela capacidade de multiplicaçăo desordenada de células anormais, que podem atingir partes proximais adjacentes e órgăos a distância1. Em relaçăo ŕs estimativas mundiais, a Agęncia Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) estipula que em 2040 haverá 30,2 milhőes de pessoas no mundo acometidas por neoplasias2.

 

No Brasil, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), as estimativas para cada ano do trięnio 2023-2025 preveem a ocorręncia de 704 mil novos casos de câncer. Em virtude disso, a doença é considerada um dos principais problemas de saúde pública no mundo3. A cada ano, 56,8 milhőes de pessoas necessitam de cuidados paliativos, dos quais 28,2% (cerca de 14 milhőes) correspondem aos pacientes com neoplasias malignas que precisam de cuidados paliativos na vida adulta4.

 

O curso da doença geralmente progride com sinais e sintomas como dor, fadiga, náuseas e vômitos, edema ou linfedema, constipaçăo ou obstruçăo intestinal, diarreia, sangramento e depressăo que culminam em perda funcional e declínio da qualidade de vida5. No âmbito do tratamento aos pacientes oncológicos, os cuidados paliativos foram redefinidos em um consenso de especialistas em 2020 como cuidados holísticos de indivíduos em todas as idades com sofrimento sério relacionado ŕ saúde em razăo de doenças graves e especialmente daqueles próximos ao fim da vida6.

 

De acordo com Santos et al.7, compete ao fisioterapeuta estar inserido na conduta interdisciplinar desde a prevençăo e tratamento aos cuidados paliativos, agindo nos distúrbios cinéticos funcionais advindos tanto da doença quanto do tratamento, promovendo a qualidade de vida e funcionalidade. Assim, a avaliaçăo com dados quantitativos é essencial para embasar o plano terapęutico, podendo-se fazer uso tanto de escalas quanto de testes funcionais.

 

Em virtude do quadro clínico do paciente oncológico, é primordial uma avaliaçăo criteriosa visando a coleta de dados da doença e nível funcional para diagnóstico e prognóstico fisioterapęutico. Para determinar com melhor precisăo sua funcionalidade, săo necessários dados sobre a locomoçăo do paciente, sua mobilidade global, a necessidade de auxílio para as atividades de vida diária, atividades instrumentais da vida diária e o uso de órteses e dispositivos auxiliares de marcha8.

 

Contudo, a avaliaçăo nesse público-alvo se dá de forma generalista e por vezes sem considerar aspectos importantes que influenciam diretamente no prognóstico da doença e qualidade de vida8. Ŕ vista disso, a escala Palliative Performance Scale (PPS)8, elaborada especificamente para pacientes em cuidados paliativos, considera deambulaçăo, atividade e evidęncia da doença, autocuidado, ingesta e nível de conscięncia. Considerando os sintomas mais frequentemente autorrelatados, a Edmonton Symptom Assessment System (ESAS)8 é uma pontuaçăo que permite presumir a gravidade. Já a escala de Medida de Independęncia Funcional (MIF)9 pode ser uma opçăo de avaliaçăo mais assertiva, visto que pontua conforme o nível de independęncia a capacidade de realizar cuidados pessoais, controle esfincteriano, mobilidade, locomoçăo, comunicaçăo e conhecimento social.

 

Além disso, a avaliaçăo da força muscular periférica também é um importante preditor de funcionalidade, estando diretamente relacionada, como demonstra o estudo de Nava et al.10. No entanto, apesar do que os estudos apontam, a correlaçăo da força muscular e das escalas de funcionalidade ainda năo foram abordadas em pacientes sob cuidados paliativos, por isso os objetivos deste estudo foram avaliar os sintomas e a funcionalidade de pacientes oncológicos em cuidados paliativos internados e correlacionar com a força muscular.

 

MÉTODO

Estudo transversal analítico em pacientes internados no Hospital Universitário Joăo de Barros Barreto na Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon). Os pacientes identificados para a avaliaçăo foram triados previamente, considerando apenas os que estavam em acompanhamento conjunto ou exclusivo de cuidados paliativos. Todos que correspondiam aos critérios de elegibilidade da pesquisa durante o período do estudo entre maio e dezembro de 2024 foram incluídos. As avaliaçőes foram realizadas individualmente por um único pesquisador, os pacientes autorizaram sua participaçăo com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

Foram incluídos pacientes com idade igual ou superior a 18 anos, de ambos os sexos, que tinham diagnóstico confirmado de qualquer neoplasia maligna, com indicaçăo para cuidados paliativos. Foram excluídos pacientes com Glasgow abaixo de 8, com rebaixamento do nível de conscięncia, com instabilidade hemodinâmica ou que estavam em processo ativo de morte.

 

A avaliaçăo foi composta pela coleta de dados epidemiológicos, aplicaçăo de tręs escalas: a ESAS, a PPS e a MIF, além do teste de força muscular com uso do dinamômetro hidráulico.

 

A ESAS é uma escala de sintomas que pontua de 0 a 10 os sintomas mais relatados em pacientes oncológicos, entre eles dor, cansaço, náusea, depressăo, ansiedade, sonolęncia, apetite, sensaçăo de bem-estar, falta de ar e qualidade do sono. Na somatória, espera-se que pacientes em cuidados paliativos apresentem uma alta pontuaçăo, considera-se a pontuaçăo total de 0 a 30 leve, 31-69 moderado e 70-100 grave11.

 

A PPS confere uma pontuaçăo de 100% a 0%, considerando cinco domínios: deambulaçăo, atividade e evidęncia da doença, autocuidado, ingesta e nível de conscięncia. Quanto menor o escore, menos funcional e mais próximo do óbito o paciente estará.

 

A MIF avalia 18 itens, referentes ŕs subescalas de autocuidados, controle de esfíncteres, transferęncias, locomoçăo, comunicaçăo e aspecto cognitivo social. Pontua as informaçőes obtidas em uma escala de um a sete para cada item, na qual o escore 1 representa a total dependęncia do paciente e o escore 7, a total independęncia. O escore total na MIF é calculado a partir da soma de pontos atribuídos a cada item dentro das categorias, com pontuaçăo mínima de 18 e máxima de 126, assim, escores maiores representam melhor funcionalidade.

 

A força muscular periférica foi mensurada por meio da preensăo palmar do lado dominante pelo dinamômetro hidráulico manual em escala quilograma-força (kgf), com o paciente sedestado e o cotovelo posicionado no ângulo de 90°. Foi solicitada a máxima contraçăo contra o aparelho por tręs vezes, sendo considerada a média do resultado para análise. Os parâmetros de normalidade estabelecidos foram 15 kgf para mulheres e 33,7 kgf para homens. Em razăo da grande disparidade entre parâmetros, optou-se por considerar um estudo com pacientes oncológicos12.

 

Utilizou-se o programa de software Stata13 18.0 para realizar as análises. As variáveis contínuas foram apresentadas em mediana e intervalo interquartílico, as variáveis categóricas em frequęncias absoluta e relativa. Para a avaliaçăo de normalidade das variáveis quantitativas, utilizou-se o teste de Shapiro-Wilk, considerou-se uma distribuiçăo normal quando p>0,05. Todas as variáveis contínuas apresentaram distribuiçăo normal de acordo com o teste de Shapiro-Wilk. A análise de correlaçăo foi feita pelo teste de Spearman com nível de significância para rejeiçăo da hipótese nula estabelecida previamente em 5%. A apresentaçăo dos resultados foi feita em tabelas e gráficos de dispersăo.

 

O estudo foi aprovado pelo Comitę de Ética em Pesquisa do Núcleo de Pesquisa em Oncologia sob número de parecer 7.325.228 (CAAE: 81519524.1.0000.5634) de acordo com a Resoluçăo 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS)14.

 

RESULTADOS

Foram incluídos 30 pacientes, dos quais mais de 50% dos casos eram de adultos abaixo de 60 anos, a maioria (66%) de mulheres, 60% possuíam companheiros, dos quais em 40% dos casos eram os cuidadores principais. O estado socioeconômico também apontou que 86% tinham baixa renda. Do total, 16 (53%) recebiam algum benefício, seja pela doença ou por tempo de serviço, e configuravam a renda principal familiar. Além disso, 30% estavam afastados do trabalho e sem renda nenhuma, enquanto 16% ainda se mantinham ativos no trabalho, apesar da gravidade da doença, por necessitarem compor a renda (Tabela 1).

 

Sobre o estilo de vida, apesar de um número expressivo apresentar fatores de risco que contribuem para a ocorręncia de neoplasias, como tabagismo (43%), etilismo (36%) e o sedentarismo (76%), năo houve relaçăo sobre o status funcional por meio da dinamometria e escalas (Tabela 1).

 

As características neoplásicas apontaram os tumores do sistema digestivo como os mais prevalentes (30%), seguidos por geniturinário (26%), respiratório e mama (16% cada). Do total, 66% demonstraram influęncia genética com a presença de outros casos na família. Dos tratamentos antineoplásicos, 90% realizaram alguma intervençăo, sendo 76%, a quimioterapia, 73%, alguma cirurgia oncológica e 50%, a radioterapia. Apesar de năo ser um número significativo, 10% năo receberam nenhum tratamento, pois, até o momento em que receberam o diagnóstico, a doença já estava muito avançada e năo possuíam mais performance status (Tabela 1).

 

Tabela 1. Caracterizaçăo do perfil sociodemográfico, da neoplasia e as médias das escalas de sintomas, funcionalidade e dinamometria

Variáveis

Frequęncia (%) / ±desvio-padrăo

Idade

Média

<60 anos

>60 anos

 

55,3 / ±12,86

16 (53,3)

14 (46,6)

Gęnero

Feminino

Masculino

 

20 (66,6)

10 (33,3)

Estado Civil

Solteiro

Casado/uniăo estável

Divorciado

Viúvo

 

7 (23,3)

18 (60)

2 (6,6)

3 (10)

Procedęncia

Capital

Regiăo metropolitana

Interior do Estado

 

17 (56,6)

5 (16,6)

8 (26,6)

Renda familiar (em salários)

<1 salário

1–2 salários

2–3 salários

 

5 (16,6)

21 (70)

4 (13,3)

Etilismo

Sim

Năo

 

11 (36,6)

19 (63,3)

Tabagismo

Sim

Năo

 

13 (43,3)

17 (56,6)

Exercício físico

Sim

Năo

 

7 (23,3)

23 (76,6)

Neoplasia primária

Mama

Sistema Respiratório

Sistema Digestivo

Sistema Genitourinário

Outros

 

5 (16,6)

5 (16,6)

9 (30)

8 (26,6)

3 (10)

Histórico Familiar

Sim

Năo

 

20 (66,6)

10 (33,3)

Tratamentos antineoplásicos

Radioterapia

Quimioterapia

Cirurgia oncológica

Nenhum

 

15 (50)

22 (73,3)

23 (76,6)

3 (10)

 

ESAS

Média

 

28,7/ ±15,70

PPS

Média

 

54/ ±12,20

MIF

Média

 

96/ ±22,91

Dinamometria

Média

 

14,6/ ±8,49

Legendas: ESAS = Edmonton Symptom Assessment System; PPS = Palliative Performance Status; MIF = Medida de Independęncia Funcional.

 

 

Quanto ŕs escalas, com uma pontuaçăo média de 96, a MIF (máximo 126) retratou uma funcionalidade preservada com 76,19% do potencial mantido. A PPS (média de 54) evidenciou que em funçăo da extensăo da doença muitos pacientes estavam incapazes para o trabalho, passavam a maior parte do tempo sentados ou acamados, o autocuidado era com assistęncia considerável, ingestăo de alimentos normal ou reduzida e o nível de conscięncia completa ou com períodos de confusăo.

 

A força muscular mensurada por meio do dinamômetro hidráulico com preensăo manual revelou uma média abaixo dos parâmetros de normalidade em comparaçăo com pacientes oncológicos que năo estăo em cuidados paliativos. Por outro lado, a média de 28,7 da ESAS contrapőe o resultado previsto, considerando ser uma escala que pontua os sintomas mais usuais e o quadro clínico dos pacientes em cuidados paliativos internados.

 

As correlaçőes da dinamometria e escalas conforme sexo, idade, radioterapia e quimioterapia estăo descritas na Tabela 2, houve diferença significativa apenas para dinamometria e ESAS no sexo masculino, dinamometria e PPS no sexo feminino, dinamometria e MIF no sexo feminino e dinamometria e ESAS em pacientes que năo realizaram quimioterapia, esses dados foram agrupados em gráficos (Figura 1).

O grupo feminino obteve a correlaçăo presumida entre as escalas funcionais e dinamometria, demonstrando que quanto maior a força muscular, maior é o grau de funcionalidade e independęncia. Em contrapartida, o grupo masculino evidenciou maior força muscular quanto maior a sintomatologia, assim como os pacientes que năo fizeram quimioterapia apresentaram uma ESAS e força muscular mais elevada (Tabela 2 e Figura 1).

 

Tabela 2. Correlaçăo entre dinamometria e escalas ESAS, PPS e MIF com as variáveis de sexo, idade, radioterapia e quimioterapia

Variáveis

Sexo

Idade

Radioterapia

Quimioterapia

ESAS

rho

p

M

0,68

0,03*

F

-0,012

0,95

<60

0,27

0,30

>60

0,14

0,60

Sim

0,19 

0,48

Năo

0,38

0,16

Sim

0,04

0,85

Năo

0,96

0,0005*

PPS

rho

p

 -0,01

 0,95

 

0,45

0,04*

 0,10

0,70

 0,37

0,18

 

0,15

0,57

 

0,35

0,18

 

0,34

0,10

 

0,07

0,87

MIF

rho

p

 

-0,23

 0,51

 

0,51

0,01*

 0,17

0,52

 0,36

0,19

 

0,21

0,44

 

0,31

0,24

 

0,30

0,16

 

0,17

0,70

Legendas: ESAS = Edmonton Symptom Assessment System; PPS = Palliative Performance Status; MIF = Medida de Independęncia Funcional; rho = coeficiente de correlaçăo de postos de Spearman; * = valores com correlaçăo identificada; M = masculino; F = feminino.

 

Figura 1. Correlaçőes encontradas em ordem: dinamometria e ESAS conforme o sexo masculino, dinamometria e PPS conforme o sexo feminino, dinamometria e MIF conforme o sexo feminino, dinamometria e ESAS em pacientes que năo realizaram quimioterapia

Legendas: rho = coeficiente de correlaçăo de postos de Spearman; ESAS = Edmonton Symptom Assessment System; PPS = Palliative Performance Status; MIF = Medida de Independęncia Funcional.

 

 

DISCUSSĂO

Os estudos com pacientes em cuidados paliativos oncológicos internados săo raros e geralmente acontecem com avaliaçőes generalistas voltadas para a oncologia. Em vista disso, o atual estudo obteve dados relevantes com o uso de escalas específicas para avaliar funcionalidade e sintomas, tal como sua correlaçăo com a avaliaçăo mais objetiva da força muscular. Os resultados desta pesquisa sugerem uma correlaçăo positiva entre força muscular e funcionalidade para mulheres. Ademais, trouxe novos elementos, como a relaçăo entre maior força muscular e maior sintomatologia em homens, e menor sintomatologia entre os que fizeram quimioterapia.

 

Sobre o perfil dos pacientes oncológicos em cuidados paliativos, a literatura relata que somente no Estado do Pará săo esperados 25 novos casos por męs, contando com apenas um serviço especializado no atendimento15. Corroborando os achados da atual pesquisa que indica que a maioria dos pacientes é do sexo feminino, algumas explicaçőes levantadas conferem maior predomínio em razăo da maior densidade demográfica de mulheres e mais chances de diagnóstico pelas campanhas de detecçăo específicas a esse público16-18

 

A faixa etária apontada em outros estudos indica uma maioria de idosos1621, o único estudo em que a faixa etária prevalente está entre os 51 a 60 anos é o de Castôr et al.22, contudo a presente pesquisa opőe-se ao esperado. Como justificativa, induz-se que os dados referentes ŕ prevalęncia de uma populaçăo mais jovem estăo na relaçăo de uma maior gravidade da doença com os fatores genéticos, visto que essa populaçăo foi pouco exposta aos fatores de risco determinados pelo estilo de vida.

 

Os dados socioeconômicos refletem a sociedade brasileira atualmente, em outros estudos epidemiológicos também se encontrou prevalęncia de uma populaçăo com baixa renda22, o que se relaciona diretamente com menores chances de diagnóstico precoce e, consequentemente, a descoberta tardia em um estado clínico mais avançado.

 

Referente ao estilo de vida, destaca-se a ausęncia da prática de atividade física, 76% relataram que năo faziam antes do tratamento e o restante interrompeu após o diagnóstico. Sabe-se que o exercício físico é um importante fator de prevençăo, mas, para além disso, é também aliado no combate ao câncer, e ademais permite a manutençăo da capacidade funcional23.

 

A prevalęncia de câncer no trato gastrointestinal corresponde ŕs estimativas do INCA24, nas quais, no Pará, ficou em 3° lugar, após o câncer de mama e de próstata, que possuem maior visibilidade e diagnóstico em razăo de campanhas voltadas ao público-alvo.

 

Quanto ao status funcional, observa-se em pesquisas anteriores, assim como nesta, a manutençăo de um nível satisfatório, embora haja diferenças nas escalas utilizadas. Santos et al.25, em um estudo específico para pacientes oncológicos em cuidados paliativos internados, avaliando-os com o índice de Barthel, encontraram uma média de 72,39, apontando uma assistęncia ocasional.

 

No que concerne ŕ força muscular de pacientes oncológicos, uma revisăo sistemática que considerou os pacientes que estavam em tratamento averiguou também a reduçăo da força muscular destes em comparaçăo com quem năo tem câncer, fato que sugere como um efeito colateral dos tratamentos sistęmicos.26

 

Comprovadamente, a açăo dos quimioterápicos pode promover déficit funcional do músculo esquelético em razăo do estresse oxidativo27. Além disso, o próprio avanço da doença năo somente debilita como também gera um consumo energético, năo é incomum que esses pacientes cursem com fadiga oncológica.

 

Assim, a média abaixo da normalidade encontrada, tal como a força muscular ter sido maior em pacientes que năo realizaram quimioterapia, revalida outros estudos, pois era o resultado esperado em funçăo das repercussőes do câncer e tratamentos. No entanto, o evento adjunto do grupo de quem năo realizou quimioterapia prévia também apresentou mais sintomas, de acordo com a ESAS, explica-se pela quimioterapia auxiliar no controle da evoluçăo neoplásica e, consequentemente, da sintomatologia.

 

O desfecho presumido de que quanto maior a força muscular, maior é o grau de funcionalidade e independęncia foi constatado no grupo feminino. Em contrapartida, o grupo masculino evidenciou maior força muscular quanto maior a sintomatologia.

 

Entre as hipóteses levantadas, o tempo de internaçăo pode ser considerado como no estudo de Barci et al.28, que avaliou durante os tręs primeiros dias a ESAS e verificou que a prevalęncia dos sintomas foi maior no primeiro dia da internaçăo, ao longo dos dias houve melhora na intensidade da dor, cansaço e depressăo.

 

Năo há estudos que apontam uma correlaçăo entre a força muscular e os sintomas, porém Mendes et al.29 encontraram correlaçăo negativa entre a funcionalidade e sintomas, indicando a presença de mais sintomas em uma capacidade funcional mais baixa. O estudo também aponta que os pacientes em cuidados paliativos apresentaram alguns sintomas em níveis superiores aos pacientes oncológicos e ŕ populaçăo em geral.

 

Contrapondo esta pesquisa, que obteve uma média geral da ESAS abaixo do resultado previsto, com provável relaçăo ao tempo de internaçăo, observou-se que a escala só terá um acompanhamento longitudinal fidedigno nos casos em que năo há controle eficaz dos sintomas.

 

CONCLUSĂO

O uso de escalas específicas para avaliar a funcionalidade e sintomas dos pacientes oncológicos em cuidados paliativos é imprescindível para determinar o status funcional e o prognóstico da doença. Nesse sentido, o presente estudo abordou, para além das escalas, a correlaçăo destas com a força muscular e constatou que para o grupo feminino existe uma correlaçăo positiva entre as escalas funcionais e a dinamometria. Além disso, o grupo masculino evidenciou maior força muscular quanto maior a sintomatologia e nos pacientes que năo fizeram quimioterapia.

 

 

CONTRIBUIÇŐES

Todos os autores contribuíram substancialmente na concepçăo e no planejamento do estudo; na obtençăo, análise e interpretaçăo dos dados; na redaçăo e revisăo crítica; e aprovaçăo final da versăo publicada.

 

 

DECLARAÇĂO DE CONFLITOS DE INTERESSE

Nada a declarar.

 

 

DECLARAÇĂO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS

Todos os conteúdos subjacentes ao texto do artigo estăo contidos no manuscrito.

 

 

FONTES DE FINANCIAMENTO

Năo há.

 

 

REFERĘNCIAS

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3. Instituto Nacional de Câncer [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; [data desconhecida]. Estatísticas de câncer. 2022 [atualizado 2025 abr 03; acesso em 2025 jan 20]. Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/numeros/

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Recebido em 21/3/2025

Aprovado em 26/6/2025

 

Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777

 

 

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