ARTIGO ORIGINAL

 

Fibro Placa: Produto Inovador Impresso em 3D para Redução de Fibrose em Paciente com Linfedema Secundário ao Câncer de Mama

Fibro Placa: Innovative 3D-Printed Product for Fibrosis Reduction in a Patient with Secondary Lymphedema after Breast Cancer

Fibro Placa: Producto Innovador Impreso en 3D para la Reducción de la Fibrosis en un Paciente con Linfedema Secundario al Cáncer de Mama

 

 

https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2025v71n4.5336

 

Lucas Maiola Astolfo1; Tiffany Maria Pimenta Silva2; José Antonio Vicentin3; Claudio Pereira de Sampaio4; Ana Paula de Melo Ferreira5; Sônia Maria Fabris6

1,3-6Universidade Estadual de Londrina. Londrina (PR), Brasil. E-mails: lucasmaiola.fisio@gmail.com; zevicentin@gmail.com; claudiopereira@uel.br; anapaulamelo@uel.br; sofabris@uel.br. Orcid iD: https://orcid.org/0009-0000-3477-2154; Orcid iD: https://orcid.org/0009-0000-0848-9750; Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-2310-8674; Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-9307-6244; Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-4785-6765

2Universidade Tecnologica Federal do Paraná. Curitiba (PR), Brasil. E-mail: tiffanymariaps@gmail.com. Orcid iD: https://orcid.org/0009-0007-6316-0510

 

Endereço para correspondência: Lucas Maiola Astolfo. Rua Prefeito Hugo Cabral, 1145 – Centro. Londrina (PR), Brasil. CEP 86020-111. E-mail: lucasmaiola.fisio@gmail.com

 

 

RESUMO

Introdução: O linfedema é uma das complicações mais comuns associadas ao tratamento do câncer de mama, especialmente em decorrência de intervenções cirúrgicas na região axilar. Esta complicação gera acúmulo de fluido linfático no espaço intersticial, ocasionando edema. Tem caráter progressivo e, em estágios mais avançados, há o desenvolvimento de fibrose, a qual compromete a função do sistema linfático, pois diminui a capacidade de drenagem linfática e, consequentemente, reduz a eficácia dos tratamentos conservadores. Objetivo: Desenvolver um produto impresso em 3D capaz de otimizar o tratamento conservador nas áreas de fibrose do linfedema secundário ao câncer de mama. Método: O produto, intitulado de Fibro Placa, foi desenvolvido de maneira interdisciplinar entre as áreas da Fisioterapia e do Design e impresso com o filamento de TPU na impressora 3D Ender 5 Plus. Após a confecção, o produto foi inserido dentro do enfaixamento compressivo multicamadas sobre a área de fibrose – porção posterolateral e proximal do antebraço esquerdo – de uma paciente com linfedema secundário ao câncer de mama. A intervenção durou 12 semanas e foi avaliada a partir da perimetria do antebraço esquerdo, delimitação da área da fibrose e ultrassonografia, dessa mesma área. Resultados: Houve redução da circunferência do membro, da área de fibrose e diminuição da espessura do tecido fibroso. Conclusão: A Fibro Placa foi capaz de gerar resultados benéficos para o tratamento da área de fibrose dessa paciente, podendo vir a contribuir com o manejo da fibrose no tratamento conservador de linfedema.

Palavras-chave: Neoplasias da Mama; Linfedema Relacionado a Câncer de Mama; Fibrose; Impressão Tridimensional; Serviços de Fisioterapia.

 

 

ABSTRACT

Introduction: Lymphedema is one of the most common complications associated with breast cancer treatment, especially as a result of surgical interventions in the axillary region. This complication results in the accumulation of lymphatic fluid in the interstitial space, leading to edema. It is progressive in nature, and in more advanced stages fibrosis develops, which compromises the function of the lymphatic system by reducing lymphatic drainage capacity and, consequently, decreasing the effectiveness of conservative treatments. Objective: To develop a 3D-printed product capable of optimizing conservative treatment in fibrotic areas of secondary lymphedema after breast cancer. Method: The product, named Fibro Placa, was developed through an interdisciplinary collaboration between the fields of Physiotherapy and Design and was printed using TPU filament on an Ender 5 Plus 3D printer. After fabrication, the product was placed within multilayer compression bandaging over the fibrotic area –posterolateral and proximal portion of the left forearm – of a patient with secondary lymphedema after breast cancer. The intervention lasted 12 weeks and was evaluated using left forearm perimetry, delineation of the fibrotic area, and ultrasonography of the same region. Results: There was a reduction in limb circumference, fibrotic area, and fibrous tissue thickness. Conclusion: The Fibro Placa was able to produce beneficial results for the treatment of this patient’s fibrotic area and may contribute to fibrosis management in the conservative treatment of lymphedema.

Key words: Breast Neoplasms; Breast Cancer Lymphedema; Fibrosis; Printing, Three-Dimensional; Physical Therapy Services.

 

 

RESUMEN

Introducción: El linfedema es una de las complicaciones más comunes asociadas al tratamiento del cáncer de mama, especialmente como consecuencia de intervenciones quirúrgicas en la región axilar. Esta complicación provoca la acumulación de líquido linfático en el espacio intersticial, ocasionando edema. Tiene carácter progresivo y, en etapas más avanzadas, se desarrolla fibrosis, la cual compromete la función del sistema linfático al disminuir la capacidad de drenaje linfático y, en consecuencia, reducir la eficacia de los tratamientos conservadores. Objetivo: Desarrollar un producto impreso en 3D capaz de optimizar el tratamiento conservador en las áreas de fibrosis del linfedema secundario al cáncer de mama. Método: El producto, denominado Fibro Placa, fue desarrollado de manera interdisciplinaria entre las áreas de Fisioterapia y Diseño, y se imprimió con filamento de TPU en la impresora 3D Ender 5 Plus. Tras su confección, el producto se colocó dentro de un vendaje compresivo multicapa sobre el área de fibrosis –porción posterolateral y proximal del antebrazo izquierdo– de una paciente con linfedema secundario al cáncer de mama. La intervención tuvo una duración de 12 semanas y fue evaluada mediante perimetría del antebrazo izquierdo, delimitación del área de fibrosis y ecografía de la misma región. Resultados: Se observó una reducción en la circunferencia del miembro, en el área de fibrosis y en el espesor del tejido fibroso. Conclusión: La Fibro Placa fue capaz de generar resultados beneficiosos en el tratamiento del área de fibrosis de esta paciente y podría contribuir al manejo de la fibrosis en el tratamiento conservador del linfedema.

Palabras clave: Neoplasias de la Mama; Linfedema del Cáncer de Mama; Fibrosis; Impresión Tridimensional; Servicios de Fisioterapia.

 

 

INTRODUÇÃO

O linfedema é uma condição resultante da insuficiência do sistema linfático, caracterizada por um comprometimento do transporte da linfa. Essa disfunção leva ao acúmulo de fluido linfático no espaço intersticial, ocasionando edema, predominantemente em extremidades1. O linfedema é uma das complicações mais comuns associadas ao tratamento do câncer de mama, especialmente em decorrência de intervenções cirúrgicas na região axilar. A incidência de linfedema em membro superior tende a aumentar progressivamente até dois anos após o diagnóstico ou intervenção cirúrgica para tratamento do câncer de mama2.

 

O linfedema é classificado clinicamente em três estágios progressivos: I – é caracterizado por edema leve, reversível, especialmente ao repouso; II – apresenta edema irreversível e presença de fibrose inicial; e III, ou elefantíase, – evidencia alterações significativas na arquitetura tecidual, como espessamento cutâneo e fibroses densas3.

 

A Terapia Física Complexa (TFC) é considerada o tratamento padrão-ouro para controle do linfedema. Ela é dividida em duas fases: a fase intensiva, que compreende drenagem linfática manual, enfaixamento compressivo multicamadas, exercícios linfomiocinéticos e cuidados com a pele; e a fase de manutenção, voltada à continuidade do tratamento com o uso de vestes compressivas, automassagem e exercícios orientados1.

 

A fibrose desempenha um papel central na regulação da função linfática em curto e longo prazo, evidenciando uma relação direta com a piora do linfedema, caracterizada pelo comprometimento da drenagem linfática e pela supressão da linfangiogênese4. A fibrose linfostática difere da fibrose cicatricial pós-cirúrgica, pois é resultado da cronicidade do acúmulo linfático e da inflamação persistente, levando à deposição anormal de colágeno e alterações na matriz extracelular4. A literatura demonstra que, em estágios mais avançados de linfedema, a TFC pode apresentar resposta limitada nas áreas fibrosadas, exigindo estratégias terapêuticas complementares3.

 

A interação das áreas do design e da saúde, por meio da fabricação digital, cresceu durante a pandemia como solução para a produção de equipamentos de proteção individual que estavam em falta5,6. Entende-se como fabricação digital o conjunto de diversas tecnologias de manufatura para a produção de quantidades limitadas de produtos, isso permite que a produção seja realizada localmente a partir de modelos digitais 3D7. A fabricação digital a partir de modelo digital 3D tem estado presente na área da saúde, principalmente na elaboração de novas abordagens terapêuticas como o desenvolvimento de próteses e órteses individualizadas8, e na dinamização de procedimentos cirúrgicos, melhorando o prognóstico e a qualidade de vida9.

 

Dessa forma, o objetivo do estudo foi empregar a fabricação digital, unindo os conhecimentos das áreas de Fisioterapia e Design para elaborar um produto inovador, impresso em 3D, que complementasse o tratamento conservador da TFC, atuando diretamente sobre a área de fibrose de uma paciente com linfedema secundário ao câncer de mama.

 

MÉTODO

Estudo de desenvolvimento e viabilidade de uma placa de compressão terapêutica individualizada, impressa em 3D, para controle da fibrose no tratamento conservador de linfedema secundário ao câncer de mama. Foi utilizado o Design Thinking como abordagem norteadora de todo o processo de desenvolvimento do produto. Trata-se de um modelo iterativo de pensamento, de solução de problemas, exploração de oportunidades e criação de valor10-13, o qual viabiliza o processo de inovação14-17.

 

Considerando esta abordagem, a elaboração do produto passou por quatro etapas principais: 1) imersão do problema por meio de conversa com especialista, seguida de pesquisa de similares e revisões de literatura relacionados ao tema; 2) ideação do protótipo com uso de esboços manuais e discussão em equipe; 3) experimentação, por meio de modelagem 3D digital e impressão 3D de protótipos; 4) teste, supervisionado pelo fisioterapeuta, dos protótipos na paciente, seguido de discussão e remodelagem para melhorias.

 

Cada etapa foi realizada de modo interdisciplinar, combinando os conhecimentos do Design (como o desenvolvimento e a construção de um modelo virtual 3D) e da Fisioterapia (com as aplicações necessárias para a prática clínica). Essas atividades foram desenvolvidas no Laboratório de P&D e Fabricação Digital do Hospital Universitário de Londrina (Fab.i®HU), órgão suplementar da Universidade Estadual de Londrina (UEL), o qual dispõe de estrutura adequada para impressão 3D de produtos em dois processos distintos: Digital Light Processing (DLP) para peças em resina líquida fotossensível a partir da projeção de uma fonte de luz e Fused Deposition Modeling (FDM), que produz peças a partir da deposição de filamento termoplástico fundido. Ambos os processos permitem construir objetos camada por camada, e neste estudo foi utilizado o processo FDM. Foram produzidas duas versões de protótipos até se chegar ao produto final. As duas utilizaram os mesmos materiais, o software Rhinoceros® 7 para a construção do modelo digital 3D e o filamento de termoplástico de poliuretano (TPU) para a impressão 3D no equipamento Ender 5 Plus da Creality®.

 

Cabe ressaltar que a determinação prévia dos requisitos de design (o que o produto deve atender) e atributos de design (que características ele deve ter) é essencial para orientar o desenvolvimento do produto. Estes requisitos e atributos derivam diretamente da Etapa 1 (Imersão). Por isso, na Etapa 1, determinou-se que o produto deveria possuir maleabilidade suficiente para se adaptar ao formato do membro, mas sem comprometer a resistência superficial necessária para gerar pontos de pressão sobre a fibrose. A concepção do primeiro protótipo (Etapa 2), e sua modelagem e impressão (Etapa 3) incorporaram os requisitos e atributos, permitindo o avanço para a Etapa 4, na qual se confirmou que o modelo atendia aos requisitos de maleabilidade e resistência.

 

Após a materialização do primeiro protótipo, foi observado que seu design tinha muitos ângulos retos, pelo formato hexagonal, e isso poderia causar lesões cutâneas. Além disso, em relação à área de contato, tinha mais espaços vazados do que em alto-relevo, podendo não gerar a pressão necessária e diminuir a eficiência do produto. Com base nessas observações, o primeiro protótipo passou por modificações formais e estruturais para otimizar a sua função e minimizar o risco de lesões cutâneas. O protótipo 2 teve sua estrutura inspirada na manobra em “S”, uma técnica manual da drenagem linfática que consiste em deslizar os polegares, com uma certa pressão, na mesma direção, mas em sentidos opostos, buscando o formato da letra S, com intuito de mobilizar a rigidez subcutânea da fibrose18,19. A disposição dos relevos visou reproduzir o posicionamento dos polegares. Ademais, o formato hexagonal foi substituído pelo formato esférico, com intuito de eliminar as quinas e aumentar a segurança do produto. Essas modificações resultaram na versão final do produto: uma placa retangular com relevos de acabamento arredondado, intercalados com áreas vazadas em sua superfície (Figura 1).

 

Padrão do plano de fundo

Descrição gerada automaticamente 

Figura 1. Protótipos impressos durante o desenvolvimento do produto: a) protótipo 1 e b) protótipo 2, versão final

 

Após o desenvolvimento do produto, sua versão final foi testada em uma paciente. Os critérios de inclusão foram: paciente em estágio avançado de lindefema (II) secundário ao câncer de mama, com presença de fibrose. Os critérios de exclusão foram: paciente em estágio inicial de linfedema (estágio I), sem presença de fibrose. A classificação do estágio de linfedema utilizada foi conforme Grada e Phillips3. Paciente H. F. M., selecionada por conveniência, já estava sendo acompanhada no ambulatório de fisioterapia e se enquadrava nos critérios, sexo feminino, idosa, 75 anos, apresentava linfedema estágio II no membro superior esquerdo e uma extensa área de fibrose na região posterolateral e proximal do antebraço, desenvolvida de forma secundária e progressiva à mastectomia radical com retirada de linfonodos à esquerda, em 2019.

 

O produto foi inserido no enfaixamento compressivo multicamadas, conforme a ordem das seguintes etapas: (1) aplicação de hidratante corporal na pele; (2) colocação da malha tubular de algodão; (3) inserção da Fibro Placa diretamente sobre a área de fibrose, com os relevos voltados para baixo; e (4) aplicação das ataduras de baixa elasticidade como camada final compressiva (Figura 2). Essa aplicação teve o objetivo de gerar uma pressão sustentada em diversos pontos da fibrose por um período prolongado. A não utilização da compressão concêntrica, com bandagem de espuma, deve-se à alergia previamente identificada da paciente ao material, o que poderia causar desconforto, reações cutâneas e comprometer a adesão ao tratamento. Essa adaptação visou garantir a segurança e o bem-estar da paciente, mantendo o restante do protocolo.

 

Figura 2. Modo de utilização da Fibro Placa. Inserida dentro do enfaixamento compressivo multicamadas conforme a ordem: (1) hidratação da pele; (2) malha tubular de algodão; (3) Fibro Placa posicionada diretamente sobre a área de fibrose, com os relevos direcionados para baixo; (4) aplicação das ataduras de baixa elasticidade como camada final

 

A intervenção teve duração de 12 semanas, de agosto a outubro de 2023, com a realização de duas sessões semanais. Essas foram realizadas no ambulatório de fisioterapia, no setor da especialidade de Ginecologia e Obstetrícia do HU – UEL.

 

A fim de avaliar a resposta da intervenção na área de fibrose, foram analisadas as seguintes variáveis: delimitação da área de fibrose por meio de palpação e medição de seu comprimento e largura; perimetria do antebraço esquerdo em três pontos específicos – 5, 10 e 15 centímetros abaixo da fossa cubital (FC) e exame de ultrassonografia da área delimitada, para avaliar os respectivos desfechos: percepção da rigidez durante a palpação; circunferência do antebraço e espessura/características do tecido subcutâneo. Duas análises foram realizadas: previamente ao uso do produto e imediatamente após as 12 semanas, permitindo uma análise comparativa da evolução do quadro.

 

A perimetria e a delimitação foram medidas a cada sessão, ao longo de seu uso, pela mesma examinadora, com experiência na aplicação da técnica. Houwen et al.20 afirmam que a perimetria é uma ferramenta confiável para o acompanhamento do linfedema, principalmente quando bem padronizada: todas as medidas feitas pelo mesmo avaliador, o qual precisa ter domínio da técnica. Segundo Rezende et al.21, a ultrassonografia diagnóstica demonstrou ser um método seguro, pouco invasivo e de baixo custo, útil para avaliar a eficácia das terapias no tratamento do linfedema monitorando as alterações e a progressão da condição como: espessura e rigidez do tecido.

 

O presente artigo foi aprovado e conduzido de acordo com as diretrizes do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sob o número de parecer 5.993.830 (CAAE: 67725423.5.0000.5231), conforme estabelecido pela Resolução n.º 466/12 do Conselho Nacional de Saúde22 (CNS) sobre pesquisas envolvendo seres humanos. A paciente concordou em participar da pesquisa e formalizou sua adesão ao assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

A perimetria revelou uma redução no volume ao longo de toda a extensão do antebraço esquerdo da paciente, incluindo a área de fibrose (Figura 3). Essa diminuição correspondeu a aproximadamente 2 cm em cada uma das medidas registradas. A delimitação da área de fibrose revelou uma redução significativa em suas dimensões, tanto em largura quanto em comprimento (Figura 4), correspondendo a uma diminuição de aproximadamente 4 cm em ambas as medidas. Os valores apresentados na sessão 1 refletem as medições realizadas antes do início da utilização do produto de compressão terapêutica.

 

Figura 3. Valores das medidas da perimetria do antebraço esquerdo, registradas antes de cada sessão do tratamento

Legenda: FC = fossa cubital.

 

 

Figura 4. Valores das medidas da delimitação da área de fibrose do antebraço esquerdo, registradas antes de cada sessão do tratamento

 

 

O exame de ultrassom apresentou uma imagem com a área de fibrose mais difusa após a intervenção (Figura 5), representando uma melhora do padrão de rigidez. Além disso, a paciente relatou como feedback as seguintes impressões: “sensação de redução do peso do membro, pele menos esticada e região mais amolecida ao toque”.

 

Figura 5. Comparação entre as imagens do ultrassom da região da fibrose do antebraço esquerdo da paciente: a) pré-intervenção (antes do uso da Fibro Placa) e b) pós-intervenção (imediatamente após as 18 sessões de tratamento). Imagem a): placa fibrótica bem delimitada, acompanhada de acúmulo localizado de líquido anecoico adjacente à área fibrótica. Imagem b): Fragmentação parcial da placa fibrótica, evidenciada por descontinuidade nos ecos hiperecogênicos que compõem a fibrose e melhor distribuição do líquido intersticial: diminuição do acúmulo local e dispersão mais homogênea do fluido no tecido subcutâneo. Setas amarelas: indicação comparativa entre as mesmas regiões da imagem a) e b)

 

 

DISCUSSÃO

Este estudo teve como objetivo desenvolver e aplicar um produto impresso em 3D que pudesse atuar como recurso complementar à TFC, inserido dentro de uma das suas etapas: o enfaixamento compressivo multicamadas, mais especificamente, entre a malha tubular e a atadura elástica, posicionado com os relevos voltados para baixo sobre a área de fibrose. A aplicação foi feita em uma área de fibrose de uma paciente com quadro clínico de linfedema estágio II, secundário ao câncer de mama.

 

A aplicação da Fibro Placa mostrou-se promissora na compressão localizada da fibrose, contribuindo para a redução da circunferência do membro, extensão da área de fibrose e modificação da textura tecidual da área acometida. Resultados similares já foram descritos na literatura, indicando que a compressão localizada pode auxiliar na remodelação do tecido fibrótico, quando associada a terapias convencionais23. Estudos recentes mostraram que alterações no tecido subcutâneo, como aumento da espessura e ecogenicidade detectáveis por ultrassonografia, estão associadas à progressão da fibrose em pacientes com linfedema pós-câncer de mama. Da mesma forma, técnicas de análise de complexidade estrutural têm identificado padrões relacionados ao acúmulo de fluido e à reorganização da matriz tecidual, o que sugere que intervenções compressivas direcionadas podem modular essas alterações teciduais24.

 

É importante destacar que o dispositivo foi integrado a um protocolo conservador já validado, não sendo utilizado isoladamente. Assim, os efeitos observados não podem ser atribuídos exclusivamente à Fibro Placa. No entanto, sua atuação localizada, associada à conformação anatômica e ao desenho personalizado, pode ter potencializado os efeitos terapêuticos, especialmente em áreas de fibrose densa, onde técnicas convencionais muitas vezes apresentam resposta limitada24.

 

A Fibro Placa não substitui as técnicas convencionais, mas representa uma inovação complementar, com base no Design Thinking, que permitiu atender a uma demanda clínica específica. O dispositivo foi concebido para mimetizar os efeitos da manobra em "S" da drenagem linfática manual, promovendo uma compressão contínua e controlada sobre a fibrose durante o enfaixamento compressivo18,19.

 

A colaboração interdisciplinar entre Fisioterapia e Design foi fundamental em todas as etapas do desenvolvimento, permitindo a criação de um produto inovador, norteado pelo Design Thinking, uma abordagem ampla de resolução de desafios10-13,25,26 que possibilitou a inovação, culminando em um registro de patente intitulada de Fibro placa. O resultado desse processo foi um artefato singular, adaptado às necessidades morfológicas da paciente, o que representa um diferencial em relação aos dispositivos de compressão convencionais. Além disso, mostrou-se seguro, uma vez que não causou lesões e tampouco desconforto à paciente.

 

Entre os principais benefícios da fabricação digital está a capacidade de produzir peças singulares e em pequenas quantidades7. Nesse contexto, foi possível produzir um dispositivo altamente individualizado, ajustado com precisão à área de fibrose da paciente, cumprindo sua função terapêutica de forma confortável. A variabilidade biológica é inerente à individualidade dos pacientes, capaz de tornar até as mesmas manifestações patológicas diferentes umas das outras. A fabricação digital pode ser mais explorada para suprir essa singularidade, oferecendo soluções personalizadas e adaptáveis às necessidades de cada indivíduo.

 

Atualmente, a principal aplicação da impressão 3D dentro da área da saúde está no desenvolvimento de próteses e órteses personalizadas8 e na otimização de procedimentos cirúrgicos9. Essa personalização é reconhecida como uma tendência promissora na medicina personalizada, especialmente em condições de tratamento prolongado ou crônico25,26.

 

Apesar dos resultados positivos, o presente estudo apresenta algumas limitações: não é possível afirmar a eficácia do produto para manejo da fibrose, tampouco a tolerabilidade prolongada do uso e efeitos secundários, para isso devem ser realizados estudos com maior amostragem e rigor metodológico, com presença de grupo controle e maior período de acompanhamento. Além disso, o protocolo aplicado neste estudo não incluiu a camada de compressão concêntrica com bandagem de espuma, em razão da alergia da paciente a esse material. Essa decisão foi necessária para garantir a segurança e o conforto da paciente, mas pode ter alterado a distribuição da pressão e a dinâmica geral do enfaixamento.

 

CONCLUSÃO

A Fibro Placa, desenvolvida por meio da impressão 3D e utilizada como complemento à TFC, mostrou-se uma estratégia promissora para o manejo da fibrose em uma paciente com linfedema secundário ao tratamento do câncer de mama. O produto contribuiu para a redução das medidas perimétricas e para a melhora clínica da textura tecidual, conforme observado por exame de imagem e relato subjetivo da paciente. Entretanto, não é possível afirmar sua eficácia de forma isolada, considerando que o dispositivo foi integrado a um protocolo terapêutico consolidado. Estudos futuros com maior número de participantes, maior tempo de acompanhamento e controle de variáveis são necessários para validar a eficácia e segurança da Fibro Placa como recurso complementar no tratamento do linfedema com fibrose. A metodologia de desenvolvimento baseada no Design Thinking demonstrou ser eficiente para gerar soluções inovadoras e centradas no paciente, apontando para um caminho viável de integração entre Design e Fisioterapia na área da saúde.

 

 

CONTRIBUIÇÕES

Todos os autores contribuíram substancialmente na concepção e no planejamento do estudo; na obtenção, análise e interpretação dos dados; na redação e revisão crítica; e aprovaram a versão final a ser publicada.

 

 

DECLARAÇÃO DE CONFLITOS DE INTERESSE

Nada a declarar.

 

 

DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS

Todos os conteúdos subjacentes ao texto do artigo estão contidos no manuscrito.

 

 

FONTES DE FINANCIAMENTO

José Antônio Vicentin recebeu bolsa de Apoio Técnico e Lucas Maiola Astolfo de Iniciação Tecnológica fornecida pela Fundação Araucária (FA) e Tiffany Maria Pimenta recebeu Bolsa de Iniciação Tecnológica pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ambas no ano de 2023.

 

 

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Recebido em 30/6/2025

Aprovado em 12/8/2025

 

Editora-científica: Anke Bergmann. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-1972-8777

 

 

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